A vasta produção do cinema indiano, de cerca de dois mil títulos por mês, ainda tem uma percepção superficial por parte da maioria do público ocidental. Aliás, muitos pensam nos filmes indianos somente como “Bollywood”, aquelas tramas românticas repletas de números musicais.
De fato, a indústria de Bollywood propriamente dita se restringe à produção de Mumbai, no idioma hindi. Mas cada estado indiano possui seu próprio cinema, muitas vezes falado na sua língua local. Os filmes bengaleses, por exemplo, são reconhecidos internacionalmente por seus temas sérios e características bem diferentes de Bollywood.
Entre os dias 21 de agosto e 1 de setembro de 2023, esteve aqui no Brasil, a convite da USP – Universidade de São Paulo, Richard Peña, professor de Estudos Cinematográficos da Columbia University (Nova York/EUA) e diretor emérito do New York Film Festival. Em dez dias, somando mais de 35 horas/aula, ele ministrou um curso sobre o cinema indiano na Cinusp, justamente para mostrar a diversidade dessa produção, muito além de Bollywood.
A cada aula, Richard Peña exibiu um filme, analisando e contextualizando-o política e socialmente. Enfim, essa rica seleção de Penã compõe a lista de 10 filmes indianos imperdíveis que apresentamos aqui.
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Lista de 10 filmes indianos imperdíveis (em ordem cronológica):
1- O Vagabundo (Awaara, 1951), de Raj Kapoor, nota: 7,5
Nesse épico extremamente melodramático, a transição entre sensações, do riso à tristeza, da ação à paixão, movimenta o filme como costuma acontecer no melhor do cinema do país.
2- A Canção da Estrada (Pather Pachali, 1955), de Stayajit Ray, nota: 9
O diretor Satyajit Ray estreia no cinema após testemunhar o neorrealismo italiano em uma viagem à Europa. É o primeiro filme da Trilogia de Apu, o título indiano mais conhecido internacionalmente.
3- Honrarás Tua Mãe (Mother India, 1957), de Mehboob Khan, nota: 8,5
Longe de ser realista, o longa apresenta vários momentos de alívio cômico. O resultado é uma experiência completa, que mexe com diversas sensações ao longo de quase três horas.
4- O Sedento (Pyaasa, 1957), de Guru Dutt, nota: 7,5
Dentro da cinematografia indiana, O Sedento foge do arquétipo tal como percebido pelo público ocidental. Afinal, não é um épico histórico com aventura, comédia e repleto de números musicais grandiosos. Pelo contrário, aqui temos um drama urbano contemporâneo, tendendo mais para o deprimente do que para o empolgante.
5- Estrela Encoberta de Nuvens (The Cloud-Capped Star, 1950), de Ritwik Ghatak, nota: 7,5
Estrela Encoberta de Nuvens lida com os problemas advindos da Partição da Índia. Por isso, o tom dramático predomina no filme, que não tem nada de humor, nem sequer um momento de alívio cômico. Além disso, a opção do diretor Ritwik Ghatak em filmar em locações, em usar alguns cortes abruptos, em desafiar a montagem invisível, produz uma inegável inquietação no espectador.
6- A Esposa Solitária (Charulata, 1964), de Satyajit Ray, nota: 9
Em A Esposa Solitária, o cineasta Satyajit Ray mostra todo o seu estilismo. Longe das influências neorrealistas que marcaram sua estreia de sucesso, Ray agora recorre a diversos recursos técnicos.
7- Uski Roti (1970), de Mani Kaul, nota: 7,5
Reflexo dos movimentos de novos cinemas em vários países, o filme de Mani Kaul rompia com a produção predominantemente clássica na Índia. Para quem acha que na Índia não há espaço para o filme de arte.
8- Ankur (1974), de Shyam Benegal, nota: 8,5
Vai além da exposição do problema para chegar à chamada para a ação política. Nesse aspecto, Benegal afirma, através de seu filme, que para mudar uma ideologia dominante, é preciso força, tanto moral quanto física.
9- Cinzas (Sholay, 1975), de Ramesh Sippy, nota: 7,5
Um dos maiores campeões de bilheteria até hoje. Chegou a ficar em cartaz por cinco anos no Minerva Theatre em Bombaim. O segredo do sucesso: era a válvula de escape que a população precisava nesses tempos tumultuados. E ainda lançou o curry western.
10- Do Coração (Dil Se.., 1998), de Mani Ratnam, nota: 7,5
Seja o romance, a música, o drama, a ação e o suspense, tudo converge para a constatação que, por trás do entretenimento, existe sempre a política, e esta deve ser discutida.