Uma visita a Roma neste ano me instigou a vontade de rever os filmes de Fellini. Principalmente, A Doce Vida, cuja história se desenrola quase que exclusivamente na capital italiana. Afinal, é quase impossível visitar a Fontana di Trevi sem se lembrar da clássica cena de Anita Ekberg banhando-se em suas águas.
Confesso que Fellini nunca foi um dos meus diretores prediletos. E La Nave Va (1983), uma de suas últimas obras, havia me deixado uma imagem de personagens caricatos e situações bizarras quando pensava no diretor italiano.
No entanto, a revisita a A Doce Vida, após talvez trinta anos após assisti-la pela primeira e única vez, tirou de mim essa imagem superficial. A dramaticidade existencial do filme derrubou de forma arrebatadora esse paradigma.
Afinal, com exceção de sua penúltima sequência, em que a bizarrice da festa é instrumento para criticar o decadente estilo de vida escolhido pelo protagonista, A Doce Vida é um drama com pinceladas de humor negro e irônico. E, que busca no realismo do retrato do cotidiano do personagem principal questões profundas sobre o sentido da vida. Aliás, o lirismo simbólico da cena final fecha em tom poético essa obra prima do cinema.
A trama
O filme retrata a vida descompromissada de Marcello (Marcello Mastroiani), um jornalista que convive com celebridades para conseguir matérias inéditas e se divertir. Na verdade, tendo esta última atividade como prioridade. Seu grande amigo é Paparazzo, fotógrafo que segue na mesma linha. Aliás, esse personagem ficou tão famoso que seu nome virou uma profissão.
Assim, vivenciamos com eles a chamada “dolce vita”, centrada na Via Veneto, avenida luxuosa e boêmia de Roma, nos anos 50. Contudo, Marcello começa a se questionar se essa vida faz realmente sentido e passa a ver suas estrepolias com olhar crítico. A doce e enigmática personagem (interpretada por Valeria Ciangottini), enquanto o atende em um restaurante de beira da praia, instiga em Marcello a dúvida sobre o significado de sua vida. Então, ele tomará sua decisão final sobre qual via seguir no segundo encontro com essa personagem.
Fellini conduz com mãos leves, mas precisas, as cenas de A Doce Vida. Dessa forma, mantém o espectador atento a todos os sentimentos do protagonista, magnificamente interpretado por Marcello Mastroiani.
Ficha técnica:
A Doce Vida (“La Dolce Vita”, 1960). 174 min. Direção: Federico Fellini. Roteiro: Federico Fellini, Ennio Flaiano, Tullio Pinelli e Brunello Rondi. Elenco: Marcello Mastroiani, Anita Ekberg, Anouk Aimée, Yvonne Furneaux, Magali Noël, Alain Cuny, Annibale Ninchi, Walter Santesso, Lex Barker, Jacques Sernas, Nadia Gray, Valeria Ciangottini, Riccardo Garrone, Ida Galli, Audrey McDonald, Polidor, Enrico Glori, Orella Fiume.