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A Esposa Solitária (filme)
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A Esposa Solitária

Avaliação:
9/10

9/10

Crítica | Ficha técnica

Mundialmente conhecido por sua Trilogia de Apu, Satyajit Ray lança em 1964 A Esposa Solitária (Charulata), seu filme mais bem sucedido nas bilheterias. Baseando-se na história “Nastaneer”, de Rabindranath Tagore, Ray constrói um drama romântico que provoca uma reflexão sobre a burguesia bengalesa ocidentalizada em Calcutá, na segunda metade do século 19.

A magistral sequência de abertura do filme revela as características dessa classe social. Charulata (Madhavi Mukherjee) vai de cômodo a cômodo no casarão onde mora, olhando do andar de cima algumas pessoas na rua, através de um binóculo. Seu marido Bhupati (Shailen Mukherjee) cruza com ela no corredor, lendo o jornal, sem nem dar conta de sua presença. Quando ele se distancia, a esposa olha para ele também através do binóculo. Por meio de engenhosa comunicação não-verbal, a sequência informa que Charulata e seu marido fazem parte de uma classe média alta. O binóculo simboliza o distanciamento com a classe mais popular da Índia, que está lá embaixo nas ruas. Da mesma forma, o binóculo indica a frieza no relacionamento do casal.

As sequências seguintes mostram o cotidiano na casa. Com isso, completa-se o quadro que descreve mais uma faceta dessa burguesia bengalesa. Afastada do povo em geral, essa classe se considera mais próxima dos britânicos, ainda os colonizadores naquela época. Assim, Bhupati veste roupas ocidentais, mescla o inglês em seu palavreado, e se interessa pelas eleições que acontecem na Inglaterra, torcendo pelo candidato liberal. Na sua casa, ele até possui pinturas que mostram o exército britânico e um busto de um herói inglês.

A história

Na trama, surgem Umapada (Shyamal Ghoshal), o irmão de Bhupati, e sua esposa Mandakini (Gitali Roy). Bhupati faz de Umapada o gestor financeiro da sua empresa jornalística. E Mandakini passa bom tempo na casa, fazendo companhia para Charulata.

Chega, então, Amal (Soumitra Chatterjee), o jovial primo de Bhupati. Logo Amal, que é poeta, e Charulata, que também escreve às escondidas, se aproximam. A atração entre eles, cresce, mas de forma sutil, através de olhares e insinuações. A certeza se consolida na cena do jardim, a única filmada fora da casa. Nesse ambiente mais livre, Charulata brinca num balanço, e um dos enquadramentos coloca Amal deitado no chão com a moça indo para lá e para cá acima da sua cabeça. Dessa forma, Satyajit Ray sugere que ele só tem pensamentos para ela. Os dois apaixonados, sintomaticamente, são os únicos personagens principais que cantam no filme. Em certo momento, Charulata até hesita ao colocar a pinta na sua testa que marca que uma mulher é casada.

Mas o mundo dos burgueses bengaleses é um mundo de simulacros, alerta o diretor Ray. O filme, que começa radiante, vai escurecendo conforme a sua história avança. Na parte final, a confiança de Bhupati em Umapada resulta numa enorme decepção. Já o amor platônico não poderá avançar além disso, sob o risco de fazer desmoronar toda essa estrutura artificial em volta de Bhupati.

Estilismo

Em A Esposa Solitária, o cineasta Satyajit Ray mostra todo o seu estilismo. Longe das influências neorrealistas que marcaram sua estreia de sucesso, A Canção da Estrada (Pater Panchali, 1955), Ray agora recorre a diversos recursos técnicos. A câmera se movimenta bastante em cima de trilhos, geralmente terminando o plano com algum detalhe importante para a narrativa. Este detalhe, da mesma forma, ganha destaque também com o uso do zoom, muito em voga na época, influência vindo da televisão. E, como costuma fazer Akira Kurosawa, Ray usa as forças da natureza para salientar os momentos dramáticos. Nesse sentido, Amal chega durante uma tempestade, e a confirmação de sua partida também acontece sob uma forte ventania.

No entanto, o recurso mais audacioso quebra os paradigmas como faziam os movimentos de novos cinemas à época da realização de A Esposa Solitária. Estamos falando das imagens congeladas que encerram o filme. Tal recurso deixa uma sensação de frieza, provavelmente insinuando o que acontecerá com Charulata e Bhupati, após este descobrir que ela ama Amal.

A Esposa Solitária constata a evolução de um cineasta que já partiu de uma estreia em alto nível. Com essa obra-prima, Satyajit Ray não deixa dúvidas de que é um dos maiores cineastas da Índia de todos os tempos.

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Ficha técnica:

A Esposa Solitária | Charulata | 1964 | 117 min | Índia | Direção e roteiro: Satyajit Ray | Elenco: Soumitra Chatterjee, Madhavi Mukherjee, Shailen Mukherjee, Shyamal Ghoshal, Gitali Roy, Bholanath Koyal.

Onde assistir:
A Esposa Solitária (filme)
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