A Marca do Assassino é um dos filmes mais famosos do diretor japonês Seijun Suzuki. Apesar disso, é um marco negativo em sua carreira como profissional. Afinal, o estúdio Nikkatsu, para o qual trabalhava, o demitiu porque o considerou ousado demais para atrair o público.
Suzuki demonstra em A Marca do Assassino a sua distinta participação na nouvelle vague japonesa, que consiste na exaltação do cinema norte-americano, recriada com características estilísticas modernas. Assim, o gênero tradicional revisto aqui é o film noir. O ator Joe Shishido, parceiro de vários filmes de Suzuki, vive Goro Hanada, um assassino de aluguel, o terceiro melhor no ranking. É dele a voz que começa a narração, típica do gênero, já nos créditos iniciais, ao som de jazz, trilha sonora preferida do noir.
Hanada aceita escoltar um importante membro de uma gangue até outra cidade. Acompanhado por um pistoleiro alcoólatra, Hamada mostra que é um excelente profissional no seu ramo. Executa sua missão com frieza, um contraste com o parceiro atrapalhado. O filme exalta suas qualidades em cenas com muita ação rápida, cortes abruptos inesperados, elipses que exigem uma compreensão além do tradicional por parte do público. Inclusive, a precisão dele se reflete nos planos que aproveitam a linhas retas da arquitetura urbana. Em algumas sequências, a habilidade do matador profissional beira o caricato. Por exemplo, quando ele atira de dentro do cano da pia e quando ele mira a vítima através de um buraco no outdoor.
Protagonista descontruído
Porém, o longa desconstrói o protagonista. Dessa forma, evita que A Marca do Assassino receba a crítica de ser um pastiche das obras do film noir norte-americano. Acima de tudo, o humor que Suzuki emprega é o diferencial. Assim, Hamada possui um vício, que não é a bebida nem as drogas, mas o inusitado hábito de cheirar arroz cozinhando. Além disso, a fragilização de Hamada se completa quando ele falha em uma missão e passa a ser caçado pelo nº1 no ranking dos assassinos. Preso num apartamento, sua vulnerabilidade é representada por planos que cortam o personagem, desafiando as melhores práticas de cinematografia.
O estilo ousado da nouvelle vague surge em alguns trechos. Note a histeria da mulher de Hamada com um close filmado de vários lados e colados em sequência. Além disso, a mais pura vanguarda na cena da paisagem da cidade exposta com o negativo do filme, provavelmente para mostrar a crueza urbana quando Hamada é caçado pelo nº1.
Do filme noir, A Marca do Assassino traz também a fotografia em preto e branco e a presença de uma femme fatale, a jovem mulher com cara sinistra que contrata Hamada para a fatídica missão.
A Marca do Assassino, realmente, está longe de ser um filme fácil para o público em geral digerir. Apesar das características do tradicional cinema hollywoodiano do gênero policial noir, o estilo ousado de filmar e editar de Seijun Suzuki pode confundir e afastar alguns espectadores. Para se ter uma ideia, até as cenas de sexo fogem do ortodoxo. Hamada tem uma relação sadomasoquista com a esposa e a relação é montada com vários planos inusitados, propositalmente evitando a sensualidade.
Mas vale a pena arriscar. Sem dúvidas, A Marca do Assassino é um filme policial empolgante.
Ficha técnica:
A Marca do Assassino (Koroshi no rakuin, 1967) Japão. 91 min. Dir: Seijun Suzuki. Rot: Hachiro Guryo, Mitsutoshi Ishigami, Chusei Sone, Atsushi Yamatoya. Elenco: Joe Shishido, Mariko Ogawa, Annu Mari, Koji Nanbara, Isao Tamagawa, Hiroshi Minami, Hiroshi Cho.
O filme A Marca do Assassino está no DVD da Versátil Home Vídeo, no box “Cinema Yakuza“