A Última Carta de Amor (The Last Letter From Your Lover) adapta para o cinema o livro de Jojo Moyes, autora inglesa do best seller “Como Eu Era Antes de Você”, que também virou filme. Mas boa parte desse romance parece se inspirar na trama de Tarde Demais para Esquecer (An Affair to Remember, 1957), no qual um acidente trágico interrompe um caso secreto de amor. O roteiro tenta disfarçar essa semelhança com uma narrativa não linear e uma outra história de paixão paralela.
São duas tramas em tempos diferentes. A mais antiga acontece em 1965, quando Jennifer Stirling (Shailene Woodley) retorna para sua casa com seu marido Lawrence Stirling (Joe Alwyn). Ela acaba de ter alta do hospital após um acidente que a fez perder a memória. Por isso, encontra algumas cartas de amor na sua casa endereçadas a ela, mas não consegue se lembrar de quem as enviou. Então, quando o filme apresenta o caso de amor dela com Anthony O’Hare (Callum Turner), isso não pode ser um flashback. Ou seja, o espectador está em vantagem em relação aos protagonistas.
Inclusive, em relação aos outros dois personagens da trama contemporânea. Nela, a jornalista Ellie Haworth (Felicity Jones) encontra uma das cartas trocadas entre Jennifer e Anthony. E, com a ajuda do arquivista Rory McCallan (Nabhaan Rizwan), ela começa a investigar a fundo essa bela paixão secreta. Tão bela que até inspira os dois colegas a mergulharem num relacionamento.
Duas personagens obviamente antagônicas
Essa investigação jornalística e o relato fragmentado dos acontecimentos dos anos 1960 ajudam a deixar as duas histórias de amor mais interessantes. Porém, algumas soluções simplórias deixam o filme óbvio. A principal delas é construir personagens femininas antagônicas. Assim, Jennifer representa o lado dramático do enredo, a dona de casa infeliz no casamento meio arranjado e hesitante em ter um caso extraconjugal. Enquanto isso, Ellie é a descolada mulher dedicada ao seu trabalho e que encara numa boa o sexo casual. A comédia domina as cenas com Ellie, incluindo aí a forma como ela conhece Rory.
Os problemas da direção
No entanto, o que mais prejudica A Última Carta de Amor é a direção fraca de Augustine Frizzell. Este seu segundo longa-metragem começa bem, com o uso de espelhos para caracterizar o duplo da protagonista, por conta da amnésia e da infidelidade. Contudo, Frizzell negligencia a fotografia. Várias cenas do filme apresentam imagens escuras, filmadas contra a luz, deixando as personagens com aparência pálida, quando deviam refletir o brilho da paixão que as ilumina. Além disso, a direção confunde o espectador ao alternar quem faz as narrações durante a leitura das cartas. Às vezes, a voz é da personagem que lê o texto, às vezes, de quem o escreveu. O descuido da direção chega até a colocar em cena o marido de Jennifer lendo o jornal enquanto ouvimos sua voz narrando uma das cartas dando, assim, a falsa impressão de que a voz representa a leitura dele.
Para piorar, no clímax dramático do encontro que definirá se Jennifer deixará o marido para viver com Anthony, a direção falha em criar o suspense. Embora coloque cenas paralelas, seguindo o que D. W. Griffith desenvolveu no início do século 20, a diretora Augustine Frizzell erra na alternância entre Anthony embarcando no trem e Jennifer chegando de carro. Assim, antes mesmo de acontecer o acidente, o rapaz já embarcou no trem. A diretora não se preocupa sequer em mostrar se faltava pouco para Jennifer chegar a tempo ao encontro. Parece que ela não o alcançaria mesmo que não sofresse o acidente. Dessa forma, desperdiça toda o potencial dessa cena que poderia ser emocionante.
Por tudo isso, A Última Carta de Amor acaba frustrando. Afinal, não adianta investir uma alta soma de dinheiro nos direitos de adaptação de uma obra de sucesso se não contratam um diretor à altura.
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Ficha técnica:
A Última Carta de Amor | The Last Letter From Your Lover | 2021 Cl| 110 min | Direção: Augustine Frizzell | Roteiro: Nick Payne, Esta Spalding | Elenco: Shailene Woodley, Felicity Jones, Callum Turner, Nabhaan Rizwan, Joe Alwyn, Jacob Fortune-Lloyd.