Filmado entre julho e setembro de 2016, Alvorada capta os últimos dias da presidente Dilma Rousseff no Palácio da Alvorada. Esse curto período marca a fase final do processo de impeachment, até a decisão final sobre seu afastamento e sua saída do cargo.
O documentário traz um registro sem filtros do dia a dia dentro do Palácio da Alvorada, residência oficial dos presidentes do Brasil. Ao invés de se concentrar somente na figura de Dilma Rousseff, a câmera invade as outras dependências da sede. Assim, consegue extrair uma reveladora impressão sobre o que ali acontece e que está além da cobertura costumeira da imprensa.
Com isso, acompanhamos os empregados dos serviços terceirizados de manutenção e buffet, que seguem sua rotina diária alheios ao turbilhão de mudanças na esfera política, mesmo que elas se encontrem tão próximas fisicamente. Por outro lado, vemos a equipe que lida diretamente com a presidente, em especial a sua assistente pessoal, gente emocionalmente envolvida com Dilma Rousseff. Um envolvimento forte e fiel, que as leva às lágrimas enquanto acompanham pela televisão o depoimento da presidente ao Senado.
Além destes, ganham destaque igual em Alvorada aqueles com cargos mais altos na equipe do governo, trabalhando para evitar o impeachment. Por fim, as câmeras se voltam para a própria Dilma Rousseff, que toma a frente de todos os atos. Todas essas variadas abordagens se intercalam no filme, e entram em ordem cronológica, conforme o desenrolar do processo.
Autocontrole emocional
Por outro lado, o documentário de Anna Muylaert e Lô Politi revela uma faceta muito informal dentro do Palácio da Alvorada. Enquanto a população em geral se acostuma com a ideia de um ambiente repleto de protocolos, vemos nos registros os funcionários trabalhando como numa empresa comum, em escritórios desprovidos de qualquer luxo. E, até mesmo os mais graduados circulam em vestimentas simples, sem o terno e gravata que apresentam quando registrados pela imprensa, e com um linguajar sem nenhuma empostação.
Como o filme não se propõe a explicar os meandros do processo de impeachment, não apresenta seu julgamento de valor sobre o caso. Alguns comentários esparsos surgem, principalmente de apoiadores, mas Alvorada sofre porque a própria Dilma Rousseff evita uma autodefesa veemente. Nesse sentido, essa atitude fica evidente quando ela declara que nunca perde o equilíbrio emocional. Esses são os trechos mais ricos do documentário, quando ela se senta com as diretoras para um depoimento exclusivo.
Porém, são poucos esses momentos, e se Alvorada não consegue apresentar uma posição mais incisiva em relação ao impeachment, isso se deve à própria Dilma Rousseff. Por trás de seu autocontrole emocional, ela deixa de ser tão transparente. Como resultado, no lugar de mais depoimentos, grande parte dos trechos com a presidente a mostra apenas andando pelos corredores do palácio. Aliás, em alguns trechos, ela pede para as câmeras serem desligadas.
Há três cenas que se destacam em Alvorada, quanto a sua montagem. Primeiro, quando Dilma Rousseff se pergunta quem ela é e a cena corta para o cão dos seguranças do palácio. Depois, já perto da conclusão, vemos as empregadas da empresa terceirizada de limpeza se sentarem à mesa da presidência e registrarem suas fotos com o celular, revelando aí o descaso com o poder e com o que está acontecendo. Por fim, a imagem de um urubu no saguão, após o veredito do impeachment, uma metáfora aos que se sucederão à presidente deposta.
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Ficha técnica:
Alvorada (2021) Brasil. 80 min. Direção: Anna Muylaert, Lô Politi.
Distribuição: Vitrine Filmes.