O filme Angela leva para as telas o assassinato da socialite Ângela Diniz (1944-1976), cometido pelo seu companheiro Raul, mais conhecido como Doca Street. O trágico incidente serve aqui como suporte para levantar a bandeira contra o feminicídio. Além disso, o empoderamento feminino predomina do início ao fim, pois o longa, ambientado nos anos 1970, revela uma sociedade que abraçava o machismo. Como sinal desse pensamento antiquado, o desquite de Ângela de seu marido Milton Villas Boas deixou a guarda dos três filhos do casal com o pai.
O enredo se inicia em 1975, sem abordar o misterioso assassinato do caseiro do amante de Ângela, o milionário Tuca Mendes. Mas revela as repercussões da condenação dela por sequestro da filha, por levar a filha para a sua casa no Rio de Janeiro, sem avisar o ex-marido que morava em Belo Horizonte. O filme deixa indícios que Ângela (interpretada por Isis Valverde) era criticada pela sociedade conservadora, percepção que só piorou quando ela iniciou um relacionamento com Raul (Gabriel Braga Nunes), que era casado. A mulher liberada em relação ao sexo ainda era um tabu, e a personagem de Bianca Bin está no roteiro justamente para reforçar essa constatação.
Preparando a vítima
Porém, para o público de hoje, com exceção dos conservadores e machistas retrógrados, o maior obstáculo para a empatia com a protagonista está no seu comportamento de socialite. As festas extravagantes, o materialismo fútil, o ar arrogante e outras peculiaridades são intragáveis. Para evitar esse bloqueio, que seria prejudicial à dramaturgia e até à bandeira aqui defendida, o filme humaniza a personagem. Mas de forma forçada. Primeiro, mostra Ângela tratando mal Lili (Alice Carvalho), a empregada da casa da praia. Depois, em outro momento, a dondoca vai até Lili e se desculpa. Feito isso, o cenário está armado para que o famoso crime ecoe com força como estandarte contra o feminicídio e a violência doméstica.
Na sequência do assassinato, o diretor Hugo Prata sai do protocolar e arrisca uma montagem que reforça a mensagem do seu longa. Quando Raul dispara os quatro tiros fatais, vemos na tela a imagem de cada uma das quatro mulheres principais do filme. É como se dissesse que o tiro não foi só contra Ângela, mas contra todas as mulheres. Mas não é o suficiente para tirar o gosto de produção burocrática.
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Ficha técnica:
Angela | 2023 | Brasil | 104 min. | Direção: Hugo Prata | Roteiro: Duda de Almeida | Elenco: Isis Valverde, Gabriel Braga Nunes, Alice Carvalho, Gustavo Machado, Bianca Bin, Emílio Orciollo Neto, Chris Couto, Carolina Manica.
Distribuição: Downtown/Paris.