Bolero: A Melodia Eterna conta a história de Maurice Ravel entre 1903 e 1937, ano de sua morte. Como se poderia prever, concentra-se em 1927 e 1928, quando compôs o seu famoso “Bolero de Ravel” para a coreógrafa Ida Rubinstein.
Um dispensável flash forward antecipa o momento em que o compositor explica para a sua contratante como surgiu a sua inspiração a partir dos sons de uma fábrica. Os créditos iniciais, que entram em seguida a esse prólogo, justificam a quem não conhece, ou não valoriza a composição. Enquanto os nomes dos talentos surgem na tela, rola uma esperta colagem com trechos de usos variados do tema, em diferentes locais do mundo.
O filme começa, de fato, com a eliminação precoce de Maurice Ravel em um concurso musical, e a consequente suposta tentativa de suicídio. Na parte final, essa mesma competição será tratada em tom de escárnio. Esses trechos servem para abrir e fechar o arco do protagonista, porém, o centro do enredo se concentra na falta de inspiração de Ravel para compor o tema do balé de Ida Rubinstein. A trama bate na tecla de que o bloqueio criativo surgiu porque a coreógrafa queria uma música carnal, que transpirasse a sexo. E Ravel era assexual, não sentia esse desejo. A trama mostra isso na sua relação com Misia, que ele considerava linda, mas nunca transou com ela, apesar de ela querer.
Como resultado disso, Ravel nunca gostou de “Bolero”. Essa rejeição aflorou quando conheceu a coreografia sensual que Rubinstein criou para a composição. Por ironia do destino, o tema se tornou o mais famoso de toda a sua obra.
“Bolero” desvalorizado
Diretora de Coco Antes de Chanel (2009)., Anne Fontaine realiza mais uma cinebiografia insossa. Antes de tudo, Bolero: A Melodia Eterna é longo demais. A parte final, quando Ravel sofre os efeitos de demência neurodegenerativa, se arrasta como se não encontrasse uma conclusão minimamente interessante.
O mais grave é que o filme convence o espectador que “Bolero” soa muito repetitiva, por conta de seu ritmo marcante. Na apresentação de gala do balé de Rubinstein, com a presença de Ravel, os cortes intensos e a insistência do olhar do compositor sobre os instrumentos de percussão demonstram com força a irritação que ele sente. O tema de “Bolero”, além disso, entra várias vezes no filme, provocando um efeito de esgotamento no público, sensação que atinge o insuportável na cena da alucinação final, uma imagem feia e sem criatividade sobre um fundo branco.
Para desgosto de Maurice Ravel e seus admiradores, Bolero: A Melodia Eterna é um filme autobiográfico que desvaloriza o seu retratado. A fim de apreciar “Bolero de Ravel”, a dica é ver Retratos da Vida (Les uns et les autres, 1981), de Claude Lelouch.
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Ficha técnica:
Bolero: A Melodia Eterna | Bolero | 2024 | 120 min. | França | Direção: Anne Fontaine | Roteiro: Anne Fontaine, Claire Barré, Pierre Trividic | Elenco: Raphaël Personnaz, Doria Tillier, Jeanne Balibar, Emmanuelle Devos, Vincent Perez, Sophie Guillemin.
Distribuição: Mares Filmes.