Canastra Suja entra na lista dos filmes que retratam com autenticidade o universo da periferia urbana brasileira.
Num subúrbio carioca, vive a família composta pelo casal Batista (Marco Ricca) e Maria (Adriana Esteves). Além deles, estão seus filhos, os jovens adultos Emília (Bianca Bin) e Pedro (Pedro Nercessian), e a adolescente autista Rita (Cacá Ottoni). Uma família disfuncional, onde ninguém é confiável, com exceção da filha mais nova.
De fato, os membros adultos da família possuem seu lado bom e seu lado perverso. O pai é alcoólatra e é levado a um encontro do AA pela filha Emília, que conhece o grupo porque o seu chefe o frequenta. O gesto bonito, de preocupação com o pai, não esconde o fato de que ela tem um flerte com o seu patrão, traindo assim seu namorado Tatu (David Junior). Mas, este, por seu lado, espera de Emília apenas sexo, tanto que transa com ela em público, numa praia à luz do dia.
Batista briga constantemente com o filho, porque ele não estuda nem trabalha. Então, surge uma oportunidade para trabalhar com o pai, como motorista de valet. Contudo, acusam Pedro de roubar o celular de um cliente, e ele se nega a permitir que revistem sua mochila. Dessa forma, se torna o principal suspeito. Nesse ambiente tumultuado, a mãe sofre vivendo como dona de casa. No entanto, afasta sua tristeza tomando anabolizantes e malhando em casa. E recebendo Tatu durante o dia para fazer sexo com ele.
Personagens dissimulados
O filme explora muito essa dicotomia dos personagens, todos possuem duas facetas antagônicas. O diretor Caio Sóh manipula o espectador, conduzindo-o a julgamentos precipitados que logo serão desmentidos. Nesse sentido, o que reforça esse ambiente conturbado visualmente é a câmera na mão, trêmula, que se move inquietamente todo o tempo. Porém, há um certo exagero no uso desse recurso por todo o filme, cansando o público.
Por outro lado, Canastra Suja se aproxima da tragédia carioca presente nas obras do dramaturgo brasileiro Nelson Rodrigues. Ou seja, expondo a sordidez do ser humano ao conviver num ambiente doentio. Nele, estão drogas, prostituição masculina, pedofilia, traição, alcoolismo, etc. As locações e atuações autênticas reforçam o realismo da estória, colocando-o lado a lado com o filme Contra Todos, de Roberto Moreira, que é a versão paulista deste ecossistema.
Contudo, há uma diferença essencial entre Canastra Suja e seu “primo” de São Paulo. Enquanto o filme de Roberto Moreira termina na tragédia, Caio Sóh opta por um encerramento mais otimista. Em sua visão, o que produz o mal na família de Barbosa é um elemento externo, como o coringa que torna suja a canastra em um jogo de cartas conhecido como buraco. Esse personagem, que não revelaremos aqui porque a surpresa é parte essencial da estória. Ele envenena as relações da família não apenas com seus atos hediondos, mas também através de fofocas colocando uns contra os outros. Sem ele, vemos a família unida e feliz.
Assim, Canastra Suja foge da plasticidade de alguns produtos brasileiros que embelezam artificialmente a miséria. Pelo contrário, aqui se mostra corajosamente a degradação das pessoas sem nenhuma estética para maquiá-la.
Ficha técnica:
Canastra Suja (2018) Brasil, 120 min. Dir/Rot: Caio Sóh. Elenco: Adriana Esteves, Bianca Bin, Marco Ricca, Pedro Nercessian, Cacá Ottoni, Milhem Cortaz, Emílio Orciollo Neto, Renato Góes.
Arthouse
Trailer:
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