Em Dois Dias, Uma Noite (Deux Jours, Une Nuit), os irmãos Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne adicionam ao drama pessoal, tema habitual do cinema deles, a questão trabalhista.
Em primeiro plano, o enredo coloca Sandra (Marion Cotillard), que sente o fantasma da sua depressão novamente atormentando a sua vida quando seu patrão a coloca numa situação injusta. A crítica social ao capitalismo selvagem, que lembra a obra de Ken Loach, se coloca como pano de fundo dessa história. E consiste no absurdo de a empresa jogar nas mãos dos 16 colegas de Sandra a dura decisão sobre sua permanência no emprego. Assim, cada empregado da equipe deve votar entre receber seu bônus anual (em média, um mil euros) e demitir Sandra ou abrir mão desse dinheiro e mantê-la na empresa. Imagine que desconforto essa situação causa agora e após a decisão, seja lá qual ela for.
Com isso, só resta a Sandra tentar falar com seus colegas durante o fim de semana para convencê-los a votarem a favor dela. Mas, a protagonista, por conta de sua depressão, não consegue se motivar para enfrentar esse desafio. Buscando forças com o apoio de uma amiga do trabalho e, principalmente, de seu marido Manu (Fabrizio Rongione), Sandra dá início a essa dura jornada.
Degrau a degrau
Dessa forma, o filme se desenrola, mostrando o passo-a-passo do esforço de Sandra. Cada conversa com um colega é uma batalha, um degrau custoso a superar para essa personagem que ainda não venceu completamente a doença que mina a sua coragem. O roteiro habilmente diversifica o que acontece em cada encontro, e o espectador logo abraça a bandeira da protagonista. Por outro lado, o filme também evita cair no maniqueísmo. Alguns colegas se tornam quase vilões, mas a maioria possui argumentos que justificam sua decisão de votar contra Sandra. Aliás, se não fosse assim, a trama cairia na superficialidade.
A luta contra a depressão também rende muitos momentos dramáticos. Principalmente, quando a personagem principal apela para atitudes drásticas. Às vezes, o marido consegue mudar a sua ideia, mas nem sempre isso acontece. Sob esse aspecto, a conclusão do filme traz um final feliz. Acima de tudo, a maior batalha de Sandra não é manter o seu emprego, mas superar sua depressão. A jornada lhe devolve a confiança de que lutar vale a pena. Com isso, Dois Dias, Uma Noite termina com sua disposição de embarcar numa nova luta. Embora Sandra ainda não tenha superado sua doença, com certeza sai fortalecida dessa luta.
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Ficha técnica:
Dois Dias, Uma Noite | Deux Jours, Une Nuit | 2014 | Direção e roteiro: Jean-Pierre Dardenne, Luc Dardenne | Elenco: Marion Cotillard, Fabrizio Rongione, Catherine Salée, Christelle Cornil, Baptiste Sornin, Pili Groyne, Simon Caudry, Lara Persain, Alain Eloy, Myriem Akheddiou.