Duas Bruxas – A Herança Diabólica (Two Witches) se beneficia da imprevisibilidade inerente às produções independentes de baixo orçamento. Nesses filmes, não existe a segurança de que o produto final tenha sido avaliado por um vasto comitê que verifica o que é apropriado para exibição ao público. É a sensação que temos quando assistimos aos filmes de José Mojica Marins, bem como ao surpreendente terror nacional contemporâneo Mal Nosso (2019), de Samuel Galli.
Esse longa de estreia do diretor americano Pierre Tsigaridis arrebata o espectador com a tensão intensa e constante da sua primeira parte. Cenas de terror se sucedem praticamente sem pausa, lembrando até o clássico indie Uma Noite Alucinante: A Morte do Demônio (The Evil Dead, 1981), que revelou o cineasta Sam Raimi. Assim, o temor de Sarah (Belle Adams), de que uma bruxa a persegue, horroriza o público com aparições inesperadas e, principalmente, pela solidão que a moça enfrenta. Ela é casada, mas seu marido Simon (Ian Michaels) desdenha do medo que ela revela. Para ele, é apenas efeito de sua gravidez.
Esse personagem masculino é desagradável, e o fraco ator que o interpreta ainda piora a percepção que temos dele. Então, quando o foco do medo passa de Sarah (que se torna a ameaça) para Simon, o filme perde muito. Não sentimos empatia por ele, por isso, não compartilhamos de seu temor como antes fizemos com Sarah. E a direção começa a apelar. Primeiro, com o uso de uma montagem com cortes rápidos que tenta simular um mergulho no sobrenatural. Depois, com gore nojento e sem sentido. Nenhuma dessas soluções consegue atingir o seu intento de assustar o público.
A segunda parte
A estrutura da narrativa, basicamente dividida em duas partes, cada uma sobre uma bruxa diferente, parece um remendo mal costurado. A primeira parte se encerra de forma capenga, e a segunda aparentemente não tem relação com ela. A solução para emendar os dois capítulos foi trazer dois personagens secundários (e sem graça) para participar desse segundo trecho.
Mas a história é outra. Agora, a estudante Rachel (Kristina Klebe, que parece velha demais para o papel) começa a estranhar sua nova colega de quarto, a romena Masha (Rebekah Kennedy, com o visual esquisito, perfeito para esse personagem). O filme revela ao público que ela é uma bruxa, mas o enredo não define se devemos temer pela vida de Rachel. Tal como o Simon da primeira parte, Rachel também não inspira nenhuma empatia. Já Masha é o mal encarnado desde que surge na tela, mas ela não se enquadra no grupo de vilões icônicos como Freddy Krueger, Jason Vorhees e companhia. Na verdade, sentimos raiva dela, porque há exagero em mostrar suas caretas diabólicas.
Novamente, o diretor apela para a montagem com planos curtos, e clichês como o atropelamento surpresa (que nunca funciona bem, salvo quando em tom cômico). Ficam evidentes os furos no roteiro, como a garota que sai com o rosto todo detonado e cheio de sangue no meio da festa e ninguém percebe.
Por fim, temos um epílogo forçado, talvez na intenção de salvar o final ridículo da segunda parte. Aqui, pelo menos, surge aquele horror mais bizarro que assustador que remete aos filmes com o nosso Zé do Caixão. As mulheres exageradamente maquiadas com suas caretas, representando bruxas, o chamado ao satanismo, o gore apelativo, enfim, é o tosco como ingrediente adicional do terror.
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Ficha técnica:
Duas Bruxas – A Herança Diabólica | Two Witches | 2021 | 98 min | EUA | Direção: Pierre Tsigaridis | Roteiro: Kristina Klebe, Maxime Rancon, Pierre Tsigaridis | Elenco: Rebekah Kennedy, Kristina Klebe, Tim Fox, Dina Silva, Belle Adams, Danielle Kennedy, Ian Michaels.
Distribuição: Synapse.