O filme polonês Furioza toca no tema dos hooligans que espalham violência pelos estádios e pelas ruas mundo afora. Mas, não foca na questão da relação com o fanatismo pelo time pelo qual torcem, e prefere trafegar por onde não há controvérsia. Ou seja, o envolvimento com o crime do tráfico das drogas e os confrontos com gangues rivais.
A história acompanha quatro membros de um grupo de hooligans chamado Furioza. Há dez anos, uma briga que resultou numa morte afastou Dawid e Dzika dessa vida. O rapaz se tornou um médico e a moça uma policial. E, agora, por conta de uma investigação sobre tráfico de drogas, Dzika convence Dawid a se infiltrar no Furioza, liderado pelo irmão dele, Kaszub. E descobrem que o braço direito de Kaszub, o ex-amigo Golden, tem esse envolvimento com Polanski, dono de uma boate. Quando se aprofunda no esquema, Dzika e seu chefe descobrem que o criminoso mais perigoso é Mrówka, o líder da gangue rival, os Formigas.
Complexo ou confuso?
Ou a trama possui uma complexidade além da necessária, ou o filme é mesmo confuso. Custamos a acreditar que Mrówka, e depois Golden, seriam capazes de arquitetar poderosos esquemas internacionais de tráfico de drogas. Enquanto o enredo conduzia para Polanski como o chefão do crime, a consistência soava mais forte.
Na verdade, o próprio diretor do filme, Cyprian T. Olencki, que aqui realiza seu segundo longa, ajuda a minar a credibilidade de Furioza. Por exemplo, a reação jocosa de Polanski quando ameaçado de morte, dando “oizinho” para a foto da sua neta, não faz sentido algum. E, para que colocar um bobão na gangue (o personagem Bula) como alívio cômico nesta história que possui um tom sério em toda sua duração? Ademais, por que Dawid se encontra às escondidas com Dzika e o chefe de polícia num bar e eles se sentam ao lado de uma janela com a persiana entreaberta? Além disso, para que uma pessoa colocaria máscara para cometer um assassinato e tiraria o disfarce logo após o crime?
Parte desses problemas da trama, talvez, resultem do fato de que esse longa-metragem seja uma versão condensada de uma minissérie com 4 capítulos de 40 minutos cada. Portanto, cerca de vinte minutos estão fora desse filme. Então, pode ser que a minissérie, com esses trechos a mais, seja mais consistente.
Na direção errada
Por outro lado, a adaptação para longa-metragem não elimina o fato de Cyprian T. Olencki abusar do uso da câmera na mão. O recurso funciona para indicar perturbação nos personagens, ou para dar dinamismo nas cenas de ação. Mas, aqui, mesmo numa conversa tranquila vemos a imagem trêmula, sem necessidade.
Já quanto à mensagem do filme, o diretor se preocupa em não incentivar a violência do clube de luta, ao empregar uma trilha musical soturna no embate entre os Furiosas com os Formigas, ao invés de uma música empolgante. Olencki acerta, também, ao apontar o erro de essa facção radical de torcedores pressionarem com agressões os jogadores, o treinador e o presidente do clube. Mas, tudo isso cai por terra com falas que defendem que a violência dos hooligans é admissível e só não vale o tráfico de drogas. De fato, perto do final, a policial Dzika diz ao seu chefe: “Pelo menos, eles (os hooligans) têm princípios.”
Enfim, Furioza mantém aberta a lacuna de um filme contundente que combata a violência entre torcedores de times de esporte. Quem sabe algum cineasta brasileiro não se aventure por levar para as telas esse problema que impede que as torcidas de dois times grandes de futebol possam torcer juntas no mesmo estádio?
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Ficha técnica:
Furioza | Furioza | 2021 | Polônia | 139 min | Direção: Cyprian T. Olencki | Roteiro: Tomasz Kimala, Cyprian T. Olencki, Tomasz Debinki | Elenco: Mateusz Banasiuk, Weronika Ksiazkiewicz, Mateusz Damiecki, Lukasz Simlat, Wojcieh Zielinski, Szymon Bobrowski, Janusz Chabior, Sebastian Stankiewicz, Konrad Eleryk, Paulina Galazka, Anita Sokolowska.
Distribuição: Netflix.