Coprodução Brasil-Argentina, o filme Homens de Barro sofre com seu roteiro desconexo.
O enredo conta a história do amor entre dois rapazes interrompido com violência. A cena de abertura revela o desfecho trágico, num parque de diversões. Uma voz em off comenta que os dois jovens estirados no chão, ensanguentados, já foram melhores amigos na infância. Um tem o apelido de Pássaro, o outro se chama Marciano.
O filme mostra a infância, quando os dois são amigos e brincam pelas ruas e parques da pequena cidade onde moram. Mas os pais possuem olarias concorrentes e, por isso, proíbem os seus filhos de andarem juntos. Depois de um grave desentendimento, o pai de Marciano morre, e o de Pássaro foge de casa e nunca mais retorna.
Na segunda parte da trama, os meninos já estão no início da fase adulta. Pássaro e Ângelo, irmão caçula de Marciano e o narrador do filme, começam a se relacionar intimamente. Porém, Marciano fica sabendo e toma medidas drásticas para acabar com esse caso.
Os problemas do roteiro
O roteiro de Homens de Barro apresenta vários problemas. Durante a fase da infância, ignora completamente o personagem de Ângelo, exceto pelas poucas intervenções como narrador. Foca apenas na amizade entre Marciano e Pássaro, e na rivalidade entre os seus pais. Esse segmento, breve demais, é insuficiente para caracterizar as personalidades dos três personagens principais do enredo, os garotos que movimentam a história na fase adulta. Enquanto Ângelo mal aparece na tela, os amigos Marciano e Pássaro apenas brincam e sofrem as reprimendas dos seus pais agressivos, sem reações que possam expor o que pensam.
Então, quando surgem como jovens, entram na trama sem que o público os conheça. O único aspecto que deriva da primeira parte e tem relevância na construção desses três personagens na cabeça do público é o fato de seus pais serem bravos (em tempo, eles gritam bastante, mas não batem nos filhos). Portanto, o espectador precisa entender quem são esses rapazes a partir do zero.
No caso de Ângelo, esse exercício pouco prejudica, pois ele não tem questões em relação a sua sexualidade. Mas, Pássaro está descobrindo que gosta de homens, o que demandaria uma exploração mais profunda sobre esse personagem. Da mesma forma, o filme não esclarece se Marciano age como age por herança do pai agressivo que tinha como modelo na infância, ou por homofobia, ou por conta da rivalidade entre as famílias (talvez desconfiando que seu pai foi morto pelo pai de Pássaro). Cabe, ainda, uma crítica aos personagens das mães, passivas e sem voz em relação a tudo que acontece (a mãe de Marciano pede a ele que converse com o irmão menor Ângelo, algo que ela mesmo deveria fazer).
A direção
O roteiro atrapalha, mas a direção de Angelisa Stein, executiva do audiovisual estreando na função, é aceitável. Pelo menos, posiciona bem a câmera, geralmente usando um tripé, sem exagerar da câmera na mão. Provavelmente, resulta da experiência do diretor de fotografia Bruno Polidoro que, além disso, capta imagens bonitas, inclusive com luz natural, apesar de alguns trechos da casa noturna parecerem escuras demais. A trilha musical, às vezes, erra. Coloca uma música tensa nas cenas em que cada pai esbraveja em casa, antecipando desnecessariamente o que ainda estaria por vir. Há também uma música de karaokê sem vozes na cena da conversa entre os irmãos que cria um ruído desnecessário. Já outra música, a indiana com arranjo lounge, é uma opção arriscada. Por ser muito marcante, beira a cafonice.
A decupagem relacionada aos encontros entre Ângelo e Pássaro causa confusão. Na primeira vez que vemos os dois transando, ao intercalar com planos de Pássaro em seu quarto, cria-se a impressão de que se trata de imaginação. Na segunda vez, o mesmo efeito acontece ao alternar as cenas do sexo com as dos dois à beira do lago. Difícil saber quando e se eles fizeram sexo.
Talvez por culpa do roteiro, ou mesmo da direção, a atuação em geral está insatisfatória. A parte inicial extrapola na gritaria geral, principalmente dos pais, que acabam por esconder possíveis destaques por parte dos atores mirins. O que parece ser fato porque quando as crianças estão sozinhas no quadro, soam bem espontâneas. Ademais, o uso de atores argentinos, provável moeda de troca no acordo de coprodução, acaba atrapalhando a naturalidade das cenas.
Enfim, tudo isso torna Homens de Barro um filme inferior. Muito vazio na construção dos personagens, confuso em questões importantes, seus problemas realçam uma perceptível indefinição de intenções.
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Ficha técnica:
Homens de Barro | 2025 | 72 min. | Brasil, Argentina | Direção: Angelisa Stein | Roteiro: Gonzalo Heredia, Fernando Musa | Elenco: Gui Mallmann, João Pedro Prates, Alexandre Borin, Cassiano Ranzolin, Rafael Guerra, Gabriela Greco, Felicitas Chaves, Néstor Monasterio, Bruno Fernandes, Artur Gaudenzi, Mariana Catalane.
Distribuição: O2 Filmes.
Estreia dia 13 de fevereiro nos cinemas.
Trailer: