Se no ano passado O Mal Que Nos Habita (2023), de Demián Rugna, foi o filme de terror que conseguiu surpreender, em 2024 este posto pode ficar com Imaculada. Conduzido com primorosa direção por Michael Mohan, esse longa ingressa em rumos impensados e rompe os limites da mesmice.
À primeira vista, sua trama parece não inovar. Lembra O Bebê de Rosemary (1968), de Roman Polanski, pela gravidez da protagonista cercada por fanáticos religiosos. Remete também às origens de A Profecia (1976), de Richard Donner – ainda a conferir se a comparação valeria também para A Primeira Profecia (2024), de Arkasha Stevenson. Além disso, a história se passa em um convento, cenário comum de vários exemplares do gênero.
Como o tema envolve a religião católica, o convento se localiza na Itália. Para lá se dirige a jovem estadunidense Cecília (Sydney Sweeney), a convite do Padre Tedeschi (Álvaro Morte – nome adequado para um filme de terror). A moça teve certeza de que foi chamada por Deus porque sobreviveu milagrosamente a um afogamento quando tinha 12 anos. No convento, Cecília testemunha acontecimentos estranhos, inclusive em alucinações. Mas, nada que supere o fato de descobrirem que ela está grávida, embora seja virgem. Por isso, ganha status de santa nesse ambiente, alvo de respeito e veneração, porém também de desconfiança e ciúme.
A direção primorosa
Michael Mohan, que já dirigiu Sydney Sweeney antes em Observadores (2021), confirma seu talento em Imaculada. Na movimentação da câmera, recorre a trilhos e gruas, como no cinema clássico. Opõe-se, assim, ao costume contemporâneo de filmar com câmera na mão – e muitos fazem isso só para facilitar o trabalho. Munido dos devidos equipamentos, Mohan conduz a imagem sem trepidações, acompanhando os personagens, de frente e lateralmente, até através de janelas, portas e corredores para desembocar em enquadramentos milimetricamente planejados, outra qualidade a se destacar no filme. Da mesma forma, emoldurar os personagens é uma constante, e reafirma a situação sem saída das vítimas.
O longa é rico em planos variados, usados seguindo os cânones do cinema, sem precisar de piruetas e truques modernos para contar sua narrativa. O uso inteligente dos tempos permite que Mohan construa um forte suspense. Ao contrário dos filmes de terror mal dirigidos, os jump scares são eficientes porque precedidos do silêncio, da pausa, da espera necessária para criar angústia no espectador. Além do mais, o diretor trabalha a dinâmica dos tons, alternando entre momentos de tensão e de respiros.
O mal em Imaculada não é sobrenatural, exceto pela conclusão que pede essa abertura. Portanto, independe de monstros e assombrações para assustar. O medo vem das pessoas ao redor, pelo que está dentro delas, ou no exterior, materializado no pano vermelho ao redor do rosto. Os detalhes importam – observe os olhos avermelhados de Cecília nos close-ups. Ou as galinhas que viram refeição e retornam em um momento crucial.
Conclusão perfeita
O crescendo do terror parece não ter limites. Por isso, espere por um final arrebatador. O absoluto desespero de Cecília resulta em atitudes inesperadas. A violência descamba de forma surpreendente. Há uma gradual descida ao inferno, com direito a confronto com o principal vilão, que termina adequadamente em fogo. A catacumba continua esse descenso, e o suspense alcança níveis difíceis de suportar. Até que a subida em direção à luz parece indicar a salvação. No trecho mais angustiante, Sydney Sweeney se entrega em gritos desesperadores da dor do parto num longo plano sem cortes. A conclusão é perfeita e fecha com brilhantismo um enredo sem máculas.
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Ficha técnica:
Imaculada | Immaculate | 2024 | 89 min | EUA, Itália | Direção: Michael Mohan | Roteiro: Andrew Lobel | Elenco: Sydney Sweeney, Álvaro Morte, Simona Tabasco, Benedetta Porcaroli, Giorgio Colangeli, Dora Romano.
Distribuição: Diamond Films.
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