Vidas de desconhecidos que se cruzam e definem o destino um do outro podem virar filme fantasioso com coincidências exagerada, como Crash: No Limite (2004). Ou então, uma história realista, tal qual Inspire, Expire (Andið eðlilega, 2018), longa de estreia da diretora Isold Uggadottir.
Em sua trama, duas mulheres que se conhecem em posições opostas descobrem, aos poucos, que têm muito em comum. Uma delas é a islandesa Lára, ex-viciada com problemas financeiros para criar seu filho. A situação parece melhorar quando ela consegue emprego como fiscal da imigração no aeroporto. Mas, precisa passar pela peneira do período de avaliação. Nesse meio tempo, é despejada de sua casa e começa a morar dentro de seu carro, com o filho. Para não assustá-lo, dá uma de Roberto Benigni em A Vida é Bela (La vita à bella, 1997) e lhe diz que fazem uma viagem de aventuras. Enquanto isso, consegue mostrar aptidão no trabalho ao desconfiar de um passaporte que realmente era falsificado.
A Islândia serve de porta de saída para o Canadá, e Lára acaba de desmascarar Adja, uma refugiada da Guiné-Bissau. Por isso, se separa de sua irmã e de sua filha, que conseguem seguir para a América do Norte. Quanto a Adja, seu destino é uma casa de detenção provisória até decidirem judicialmente sobre sua deportação. O encontro fortuito entre Adja e a responsável por destruir seus planos acontece quando o filho de Lára se perde e Adja o encontra.
Ajuda à distância
O antagonismo inicial as mantém um pouco distantes, mas as duas tentam ajudar uma a outra. O relacionamento, porém, é frio, e a ausência de trilha musical reforça essa sensação. Nesse quesito, as atrizes Kristín Þóra Haraldsdóttir e Babetida Sadjo merecem louvor por trocarem olhares sem deixarem escapar sentimentos de afetividade entre elas. Quem, de fato, ajuda a aproximar esse elo é o filho de Lára, que conta à mãe que testemunhou o choro de Adja. Ele não entende, mas a refugiada não conseguiu aprovação de seu pedido de asilo.
Então, ainda sem um momento de sentimentalismo barato, vemos nascer a conexão entre as duas mulheres, tanto pela situação difícil que enfrentam quanto pela sexualidade. Esse ponto surge ao somarmos as pistas que o filme plantou ao longo da história. No caso de Lára, isso fica mais claro porque ela transa com a mãe de um amigo de escola do filho. Já Adja foge de seu país de origem para não ter o mesmo destino da sua companheira, que foi espancada até a morte por preconceito sexual.
Mesmo sendo um filme essencialmente frio, com protagonistas que não externalizam seus sentimentos, Inspire, Expire consegue cativar o espectador com seu naturalismo. Porém, destrói essa sensação com sua conclusão apelativa. Nesse final, a música, ausente na maior parte da história, faz pano de fundo para Lára, artificialmente emancipada em seu posto em menos de 48 horas, autorizar a fuga de Adja.
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Ficha técnica:
Inspire, Expire | Andið eðlilega / And Breathe Normally | 2018 | Islândia, Suécia, Bélgica | 95 min | Direção e roteiro: Isold Uggadottir | Elenco: Kristín Þóra Haraldsdóttir, Babetida Sadjo, Patrik Nökkvi Pétursson, Kolbeinn Arnbjörnsson, Þorsteinn Bachmann.
Distribuição: Netflix.