Kuhle Wampe ou A Quem Pertence o Mundo? se tornou um filme célebre. Primeiro, por contar com o dramaturgo Bertold Brecht como um dos roteiristas. Mas, também, por sua abordagem social na sofrida Alemanha no início dos anos 1930. Adicionalmente, por mostrar o movimento comunista, uma alternativa para o nazismo que logo assumiria o poder.
Em 1932, a crise econômica provoca um brutal desemprego. A jovem Annie Bönike faz parte de uma família de operários em Berlim. Após ser pressionado pelo pai a arrumar logo um emprego, seu irmão se suicida. Então, se torna ainda mais difícil para a família pagar o aluguel do apartamento onde moram. Como resultado, eles partem para Kuhle Wampe, um acampamento nos arredores da cidade, agora cheio de desempregados. Eventualmente, Annie termina com seu namorado e retorna para Berlin e integra um movimento dos trabalhadores.
Sequência do suicídio
A primeira parte de Kuhle Wampe cativa o espectador. Principalmente, pela forma como o diretor Slatan Dudow constrói a sequência do suicídio do irmão de Annie. Utilizando a sintaxe de Griffith e a edição construtivista de Eisenstein, compreendemos a ação exclusivamente pelas imagens, apesar de esse ser um filme falado. Em paralelo, acompanhamos inserções da cena de pessoas andando rapidamente de bicicleta pelas ruas de Berlim. Mas, na trama principal, o rapaz retorna para a casa e guarda sua bicicleta, após mais um dia de inútil busca por emprego. Em casa, o pai lhe passa um sermão. Depois, acompanhamos o rapaz se preparar e saltar da janela do apartamento. Simbolicamente, vemos a bicicleta pendurada, agora sem o seu dono.
Abordagem social
Porém, posteriormente, o filme abandona a sua narrativa dramática, e tenta se sustentar no relacionamento entre Annie e seu namorado. Na verdade, Kuhle Wampe continua interessante, mas por causa de sua abordagem social. Enquanto observamos o cenário de crise econômica que leva a maior parte da população à pobreza, notamos a crescente crítica ao capitalismo.
Nesse sentido, a cena do debate dentro do metrô é emblemática. De repente, os passageiros começam a discutir acaloradamente a economia mundial. Aliás, o Brasil entra no núcleo desse embate, por causa da queima de milhões de sacas de café durante o governo Getúlio Vargas em 1931. Em um momento em que as pessoas passam fome no mundo, o presidente realiza esse ato para valorizar o preço da commodity. Ou seja, é um raciocínio cruel que só cabe no modelo capitalista, e os companheiros de Annie do movimento trabalhista argumentam sobre sua insensatez.
Então, na conclusão, Annie acompanha as manifestações dos trabalhadores, que caminham pelas ruas de Berlim entoando o hino que prega a solidariedade entre eles. Com certeza, o viés do filme é parcial, visivelmente a favor do comunismo. Mas, independente da posição política do espectador, Kuhle Wampe possui um forte impacto. Afinal, pouco tempo depois Hitler seria nomeado chefe de governo a Alemanha.
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Ficha técnica:
Kuhle Wampe ou A Quem Pertence o Mundo? (Kuhle Wampe oder: Wem gehört die Welt?) 1932. Alemanha. 80 min. Direção: Slatan Dudow. Roteiro: Bertolt Brecht, Ernst Ottwald. Elenco: Hertha Thiele, Ernst Busch, Martha Wolter, Adolf Fischer, Lili Schoenborn-Anspach.