Luz Natural, primeiro longa ficcional do diretor húngaro Dénes Nagy, é um filme de guerra centrado numa perspectiva individual de um personagem diretamente envolvido no conflito. Em O Filho de Saul (Saul fia, 2015), obra-prima do cineasta conterrâneo László Nemes, enxergávamos a história a partir de um judeu num campo de concentração. Desta vez, o olhar está no lado dos algozes, mas um que se sente desconfortável com as práticas de seus companheiros.
Conforme a cartela inicial explica, entre 1941 e 1944, o exército húngaro atuou em territórios da URSS lutando contra revolucionários. O protagonista é um deles, o Cabo Semetka, e apenas mais um deles quando tomam toda a carne do alce abatido de caçadores locais. Logo depois, o grupo rende um pequeno vilarejo, sob suspeita de colaborarem com as guerrilhas. Da mesma forma que subjugaram os caçadores, se aproveita da comida e da moradia dos pobres habitantes. Semetka, junto com outros colegas, comem da sopa que a dona da casa preparou, enquanto os membros da família assistem com fome.
A consciência de Semetka só desperta quando ele avista uma bonita moça, a quem ele veladamente começa a admirar. Mas, após uma emboscada, o batalhão perde o seu comandante e Semetka, o substituto imediato, prende todos os moradores em um celeiro. Logo, chega um comando de reforço, com um novo comandante, Koleszár, antigo conhecido de Semetka e sua família.
Enquanto Semetka e seus homens fazem uma busca nos arredores por moradores que fugiram, Koleszár manda queimar o celeiro com todas os reféns dentro. Depois, quando Semetka acompanha soldados de seu batalhão que foram feridos, ele tem a oportunidade de delatar o terrível ato de Koleszár. Porém, prefere não falar.
Direção e elenco
O diretor Dénes Nagy conta essa história em ritmo lento e com um tom de frieza que faz deste um filme de guerra dramático e não de ação. Os confrontos na floresta com os inimigos estão nas telas, mas concisos e intencionalmente sem grandiosidade. Afinal, ele quer evitar a construção de heróis. Junto com isso, o protagonista pouco fala, o que ele pensa ou sente não está expresso em palavras, mas em seu rosto taciturno que tampouco demonstra tristeza. Ao invés de se derramar em lágrimas, o que poderia ser sua desgraça num campo de guerra, ele guarda suas angústias para si mesmo.
Por isso, é impressionante a atuação de Ferenc Szabó como Semetka. Principalmente, porque esta é sua estreia em filmes. Seu semblante lembra o de Buster Keaton. No entanto, enquanto este era o comediante que nunca ri. Frenc Szabó é o ator dramático que nunca chora. E, nos dois casos, a ausência de expressões óbvias só aumenta o poder de suas atuações.
Luz Natural se destaca, também, pela sua fotografia. O tom, essencialmente escuro, transita entre paletas marrons e cinzas. Os raros instantes de iluminação parecem destacar momentos de esclarecimentos do protagonista. Por exemplo, dentro do celeiro, quando Semetka avista novamente a mulher que admira, e o crepúsculo do plano final.
Enfim, Luz Natural revela a angústia de um anti-herói humanizado. Semetka sente pesar na consciência a brutalidade do exército do qual ele faz parte, mas ele não pretende se apresentar como o corajoso mártir em defesa das pessoas consideradas inimigas.
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Ficha técnica:
Luz Natural | 2021 | Natural Light / Természetes Fény | Hungria, Letônia, França, Alemanha | 103 min | Direção e roteiro: Dénes Nagy | Elenco: Ferenc Szabó, Tamás Garbacz, László Bajkó, Gyula Franczia, Ernő Stuhl, Gyula Szilágyi, Mareks Lapeskis, Krisztian Kozo, Jozsef Barta, Aivars Kuzmins, Liene Kislicka.
Esse filme está na seleção da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.