Como fez em seu longa de estreia, Mate-me Por Favor (2015), Anita Rocha da Silveira assina o roteiro e a direção de seu trabalho subsequente, Medusa.
No quesito direção, seu novo filme revela desde a primeira cena (uma mulher dançando sob luzes vermelhas com trilha musical eletrônica) uma forte influência de Suspiria (1977), de Dario Argento. Ao longo da história, os personagens transitam em cenários que sempre indicam um pé no fantástico. Mesmo quando rodadas em locações, a fotografia e outros elementos de cena inserem um proposital toque de artificialismo na tela. Com isso, o filme ganha uma atmosfera coesa, que combina com a predominância das cenas longas. Porém, essa característica deixa o ritmo lento, culminando numa duração excessiva. Trechos de apresentações musicais, cultos religiosos, ataques nas ruas, treinamentos da milícia etc., se estendem desnecessariamente, clamando por uma edição mais enxuta.
O roteiro
Medusa se passa numa situação fictícia, mas possível. Toca na ascensão da extrema direita ao poder – o discurso do pastor deixa evidente que alfineta o governo bolsonarista. Mas foca nas suas repercussões sociais e não políticas. Nesse cenário, os religiosos conservadores se empoderam e querem ditar as regras da sociedade. Para isso, recorrem à violência. Não só por parte das milícias formadas por jovens rapazes doidos por uma briga, mas também pelas moças que atacam nas ruas as mulheres que consideram pecadoras.
A protagonista é Mariana (Mari Oliveira), integrante desse grupo de moças conservadoras e melhor amiga da líder Michele (Lara Tremouroux). O arco dessa personagem é consistente. Mariana começa como uma seguidora fiel do que prega a sua religião. Mas uma cicatriz resultante de um ferimento durante os ataques do grupo a deixa fora do padrão de beleza que as mulheres devem oferecer aos seus maridos. Além disso, perde seu emprego numa clínica estética. Aliás, reparem na crítica à superficialidade do papel das mulheres para os ultraconservadores (ou seja, ser bela e submissa) – e ainda uma provocação no uso do nome da primeira-dama do governo federal na época.
O terror atmosférico
O filme ainda insinua uma incursão ao terror com o mistério sobre Melissa, uma mulher promíscua que teve seu rosto desfigurado há décadas. Boatos indicam que ela ainda está viva, e Mariana vai trabalhar em uma clínica com pacientes em coma suspeitando que encontrará Melissa ali. Mas esse terror nunca se concretiza no filme. O que acontece é o descoberta do sexo por Mariana, evento que a leva a questionar a religião que segue. Dessa forma, se fechará o arco da sua personagem, que termina a história transformada.
Outros personagens, porém, não ganharam essa atenção. Por exemplo, a virada de Michelle acontece sem uma justificativa, e a jovem prima de Mariana ganha muito tempo de tela sem ter equivalente importância para a narrativa.
Por fim, a impressão que Medusa deixa no espectador é de ser um filme com temas fortes e contemporâneos, mas com cenas longas demais e falhas na sua narrativa (quanto a alguns personagens e ao tom que não avança para o terror). Acima de tudo, se sobressai o seu visual diferenciado, companheiro ideal para o terror atmosférico que procura criar.
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Ficha técnica:
Medusa | 2021 | 127 min | Brasil | Direção e Roteiro: Anita Rocha da Silveira | Elenco: Mari Oliveira, Lara Tremouroux, Joana Medeiros, Felipe Frazão, Bruna G, Carol Romano, João Oliveira, Bruna Linzmeyer, Thiago Fragoso, Inez Viana.
Distribuição: Vitrine Filmes.