Mulheres Armadas, Homens na Lata (Rebelles) é mais um filme que explora a bandeira do empoderamento feminino. Tema que o cinema explorou, com mais propriedade, em outras produções, notoriamente em Thelma & Louise (1991), de Ridley Scott, cuja amoralidade permeia esse lançamento francês – e que certamente influenciou a sua última cena.
Na trama, a ex-miss beleza do sul da França, Sandra (Cécile de France), retorna a sua cidade natal em Boulogne-sur-mer, falida, para morar com a mãe num trailer. Sem outra saída, vai trabalhar na fábrica de enlatados de peixes La Belle Mer (de onde vem o título original, bem mais aceitável do que o forçado nome escolhido para distribuição no Brasil). Lá, ao se defender da tentativa de estupro do seu chefe, acaba ferindo-o gravemente. Junto com suas colegas Nadine (Yolande Moreau) e Marilyn (Audrey Lamy), descobrem que ele tem uma mala cheia de dinheiro. Então, resolvem deixá-lo morrer e ficar com a grana. Mas logo perigosos traficantes partem em seu encalço.
Do enredo, salva-se apenas a criativa ideia de se livrar do cadáver moendo-o e colocando dentro de latas de sardinha. Grotesca, mas inventiva solução. E, para não desagradar demais o público, e muito menos as empresas do ramo, as latinhas não vão parar nas prateleiras do comércio.
Essa violência surge no filme inesperadamente, junto com o modo como o estuprador tem seu merecido castigo. Até então, as cores saturadas (que continuam até o final) sugerem um tom de farsa que acaba nunca se desenvolvendo a contento. A tentativa de comédia abusa do inusitado (por exemplo, quando Marilyn invade a sala de aula do filho na escola e ameaça a professora na saída por conta das notas baixas), sempre batendo na mesma tecla que não faz soar nenhuma risada.
Da sátira ao desleixo
Fica a sensação de que a sátira serve aqui como desculpa para um roteiro desleixado. Parece que vale tudo para fazer graça. Com isso, apesar de algumas situações violentas, algumas até gratuitas contra mulheres, o tom do filme se torna confuso. A sátira ainda vale nesses momentos de crueldade? O marketing do filme vende-o como sendo inspirado em Quentin Tarantino. Mas o diretor americano deixa evidente o que é farsa e o que não é (e mesmo assim sofre muitas críticas sobre o uso da violência). Já o estreante em longas Allan Mauduit deixa essa distinção numa perigosa massa cinzenta.
Além disso, Mulheres Armadas, Homens na Lata ainda tentar flertar com o drama. E, nesse quesito, descamba para soluções novelescas como a gravidez e o pai desconhecido finalmente revelado. Sem contar, ainda, outros trechos sem nexo (para que enterrar os traficantes mortos?). Tudo ainda embalado na mesma palheta de cores fortes, como se todas essas variações de tom do enredo coubessem na mesma ambientação de sátira. Essa falha, aliás, comprova o quão perdido estava o diretor Mauduit.
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Ficha técnica:
Mulheres Armadas, Homens na Lata | Rebelles | 2019 | França | 87 min. | Direção: Allan Mauduit | Roteiro: Jérémie Guez, Allan Mauduit | Elenco: Cécile de France, Audrey Lamy, Yolande Moreau, Simon Abkarian, Samuel Jouy, Béatrice Agenin, Patrick Ridremont, Tom Lecocq, Valentin Papoudof, Michel Masiero.
Distribuição: Imovision
Trailer aqui.