Não Lamento Minha Juventude (ou Juventude Sem Arrependimento) é um dos melhores filmes do início de carreira de Akira Kurosawa. Além disso, é um retrato do fascismo no Japão, que se iniciou nos anos 1930 e levou à entrada do país na Segunda Guerra Mundial. Depois, o desfecho terrível resultado no fim desse período militarizado japonês.
Observamos essa passagem histórica pelos olhos da protagonista, Yukie, em papel de Setsuko Hara, atriz constante de Yasujiro Ozu. Ela é a filha única do reitor da Universidade de Kioto. No início do filme, em 1933, Yukie está com 20 anos possui dois grandes amigos, Itokawa e Nogue. Eventualmente, o governo aperta a perseguição aos comunistas e interfere na universidade. Os estudantes se manifestam contra, tendo o ousado Nogue como um dos mais extremistas do movimento. Enquanto isso, o submisso Itokawa prefere não participar dos protestos.
O diretor Akira Kurosawa faz belo uso da montagem com fins narrativos. Dessa forma, conta a repressão da grande massa pelo governo através de uma sequência de cenas de manifestações intercaladas com noticiários de jornais. Como resultado, Nogue vai para a prisão.
Nove anos depois
Passam-se nove anos. Finalmente, Nogue sai da prisão, mas parece diferente, o que decepciona Yukie. Então, ao ouvir boatos de que ele se mudará para a China sob ocupação, ela se desespera. Kurosawa mostra esse estado de Yukie com uma ousada sequência de cenas rápidas, através do mesmo plano, com a moça em posições diferentes contra porta, com o rosto e o corpo transmitindo angústia. Por fim, ela decide sair da casa dos pais para viver sozinha em Tóquio.
Em 1941, quando Yukie se estabelece na capital, ela esbarra em Itokawa, casado e trabalhando na procuradoria do Estado. Então, ele revela o paradeiro de Nogue, que está em Tóquio e Yukio o procura. O encontro é filmado em uma angustiante lentidão, que se alinha à desconfiança dos dois. Ao mesmo tempo, contrasta com a rápida montagem que mostra a evolução que os leva a se casarem em pouco tempo. Mas, ela se entristece porque Nogue nunca lhe confessa que ainda é um revolucionário, para protege-la. De fato, essa decisão acaba salvando-a, quando a polícia captura e mata Nogue, sob acusação de ser um espião.
Arrependimento
Contudo, a estória de Não Lamento Minha Juventue não termina nessa tragédia. Nogue só teve um arrependimento na sua breve vida, o de não ter mantido contato com seus pais. Por isso, Yukie decide abdicar do conforto da casa da sua família para ajudar os pais de Nogue, pobres agricultores que sofrem a segregação da sociedade, por serem pais de um traidor.
Em suma, Não Lamento Minha Juventude se posiciona claramente contra o militarismo. O regime levou o Japão a bombardear Pearl Harbor e provocou a trágica destruição de Hiroshima e Nagasaki pelas bombas atômicas americanas. Aliás, como essa produção é de 1946, após o fim da Segunda Guerra Mundial, essa opinião já era unanimidade para os japoneses.
Essencialmente, o filme revela o “mea culpa” da população que apoiou o fascismo. Ainda mais porque seu diretor era famoso por suas influências ocidentais, como que reforçando a ocupação do país pelos estadunidenses. Ou seja, Kurosawa afirma que a cultura estrangeira contava com os portões abertos no Japão do pós-guerra.
Ficha técnica:
Não Lamento Minha Juventude (Waga seishun ni kuinashi, 1946) Japão. 110 min. Dir: Akira Kurosawa. Rot: Eijir Hisaita, Akira Kurosawa, Keiji Matsuzaki. Elenco: Setsuko Hara, Susumu Fujita, Akitake Kono, Denjiro Okoshi, Haruko Sugimura, Eiko Miyoshi, Kokuten Kodo, Takashi Shimura, Shin Takemura.