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Poster do documentário "Niède"
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Niède | Por Solange Peirão

Avaliação:
9/10

9/10

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Crítica | Ficha técnica

Niède Guidon nasceu em 1933 em Jaú (SP), em uma família de ascendência francesa. Formou-se em História Natural pela USP e especializou-se em Arqueologia pela Universidade de Paris-Sorbonne. É a desbravadora, no começo dos anos 1970, do que viria a se constituir, em 1979, no Parque Nacional da Serra da Capivara, situado à sudeste do Piauí. O parque, tombado pelo IPHAN, foi declarado Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO em 1991. Niède dirige a Fundação Museu do Homem Americano, instituição responsável pelo manejo do Parque.

Assistir ao documentário Niède é conhecer o trabalho incansável dessa cientista e seus pesquisadores. É conhecer as comunidades assentadas na região e que foram lentamente sendo educadas para respeitar esse trabalho, até serem integradas a ele. Muito mais do que uma descoberta de vestígios arqueológicos, que permitiram fazer uma revisão sobre a ocupação humana pré-histórica do Brasil e das Américas, aconteceu ali um projeto educativo exemplar.

O filme abre-se com bela cena de mulher que se movimenta numa quase dança. O que se mistura – fragmentos luminosos – a sua imagem indistinta, prepara nosso olhar para mergulhar nas primeiras tomadas abrangentes do Parque e, a seguir, nos belos signos focados das pinturas rupestres.

A partir de então, todo documentário é marcado por registros de audiovisuais, feitos ao longo de todo processo de formação do Parque, intercalados com as falas de Niède e das pessoas envolvidas no trabalho, por esses quase cinquenta anos.

As publicações já disponíveis ao público nos permitem conhecer, de antemão, as características e conquistas principais desse projeto. Trata-se de uma extensa área com mais de 1.200 sítios pré-históricos, nos quais as pinturas rupestres datam entre 4 mil e 50 mil anos, com cenas rituais do cotidiano que evocam a caça, a dança, o sexo, o parto. Desses sítios, destaca-se o da Toca do Boqueirão da Pedra Furada, por sua beleza e importância dos vestígios arqueológicos (além das pinturas, esqueletos humanos, instrumentos líticos e peças cerâmicas) que vem fornecendo.

O Museu da Natureza, inaugurado em 2018, é a edificação que expõe, de forma concentrada, o que pulsa nesse enorme museu a céu aberto: a história geológica, climática e dos animais da região, por onde circulou o homem pré-histórico.

E é nesse aspecto, o do povoamento, que tomamos contato, no documentário, com as hipóteses controversas em torno das origens desse homem pré-histórico brasileiro.

“A Serra da Capivara representou uma mudança brutal porque se dizia que o homem tinha chegado vindo da Ásia, que chegou na América do Norte, e há cerca de 13 mil anos atrás veio para a América do Sul.” (Niède Guidon)

“Essa discussão sobre povoamento é super saudável, contanto que não seja uma coisa imperialista que tente dizer que a gente não sabe verificar, não sabe trabalhar. Até 20 mil anos, os norte-americanos aceitam, a Niède dizia, quer dizer que até 20 mil anos a gente sabe trabalhar; passou disso, não. A gente tem sítios pleistocênicos, como o Sítio do Meio com possibilidade de 25 mil anos, um pouco mais, e como o do Vale da Pedra Furada, com datação calibrada de 22, 23 mil anos.” (Uma pesquisadora)

“A gente vai ter aqui um esqueleto com crânio alongado que é o Zuzu, igual à Luzia de Minas Gerais. A gente vai ter aqui no Brasil, tanto a chegada de grupos asiáticos com crânio mais achatado, quanto os grupos com ascendência muito mais semelhante ao aborígene australiano e ao africano, de crânio alongado. Todos sapiens.” (Uma pesquisadora)

Niède ainda arremata dizendo que na Serra da Capivara os registros arqueológicos, não necessariamente de esqueletos, apontam para a presença humana há 100 mil anos. E que até o aparecimento recente de artefatos datados de 130 mil anos, nos EUA, eram os mais antigos da América.

A última cena do documentário não foca em uma mulher indistinta, mas no rosto de perfil claro de Niède Guidon. Uma cientista brasileira de 88 anos, ainda às voltas com seu Parque.

O documentário está disponível na plataforma do Sesc Digital/Cinemaemcasa, integrando a 22ª Retrospectiva do Cinema Brasileiro.

Texto de autoria de Solange Peirão, historiadora e diretora da Solar Pesquisas de História.


Niède (documentário)
Niède (documentário)
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