O Filho de Saul leva o espectador a uma experiência imersiva pelos horrores dos campos de concentração nazistas. O filme ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro e o Grande Prêmio do Júri em Cannes.
Essa imersão é resultado de uma lista de mandamentos que o diretor László Nemes, o diretor de fotografia Mátyás Erdély e o diretor de arte László Rajk impuseram a si mesmos na realização do filme. Entre eles, que o filme não poderia ser bonito, atraente, nem ser um filme de terror. E, principalmente, que seria mostrado na tela somente o que estivesse dentro do campo de visão e audição do protagonista Saul. Não significa que se utiliza a câmera subjetiva, mas a câmera acompanha o personagem, nenhuma cena está fora do que ele presencia. Ademais, o som possui importância vital nesse processo, repleto de vozes das vítimas do holocausto, em diferentes idiomas, ao redor de Saul.
A história
Saul é um judeu prisioneiro dos nazistas forçado a trabalhar em um campo de extermínio. Esses detentos formavam o Sonderkommando e ganhavam uma sobrevida, mas precisavam ajudar a enterrar ou queimar as vítimas das câmeras de gás. E essa sobrevida era provisória, todos sabiam que eles também seriam executados. Por isso, há uma conspiração de rebeldes para tentarem a fuga. Saul acaba envolvido nesse plano, mas por outros motivos.
Em um dia normal de labuta, Saul recolhe os judeus recém-exterminados na câmera de gás, quando ouve tosses. Um menino ainda está com vida, mas logo um militar nazista intervém e liquida o improvável sobrevivente. Saul é ordenado a levar seu corpo para autópsia, porém, ele se sente obrigado a enterrá-lo apropriadamente na presença de um rabino. Parece que Saul reconhece o menino de sua cidade natal, mas ele não consegue encontrar seus documentos para comprovar se isso é verdade. Ainda assim, ele se arriscará para cumprir essa missão impossível que se auto impôs.
A direção
Além dos efeitos sonoros e as citadas falas desesperadas dos prisioneiros à beira da morte, o diretor László Nemes recorre a recursos visuais para ambientar o cenário apocalíptico dos campos nazistas. Assim, a primeira imagem do filme está completamente fora de foco. O desfoque diminui quando aparece o protagonista Saul, que se mantém em primeiro plano, nitidamente, enquanto o que está ao redor insiste em ficar fora de foco. Gradativamente, este efeito diminui e a câmera acompanha como um carrapato todos os passos de Saul. A presença de dois fade-outs rápidos e agressivos constrói a hostilidade do cenário.
A princípio, acreditamos que o menino morto é filho de Saul. Contudo, a procura pelos documentos dele, e, mais ainda, uma fala de um companheiro do Sonderkommando que o lembra de que ele nunca teve um filho, parecem negar essa paternidade. O filme não resolve essa dúvida. Acreditar que se trata do filho permite uma compreensão mais fácil do comportamento de Saul. Porém, o filme não deseja interpretações óbvias e, por isso, planta uma dúvida permanente no espectador com a última cena de Saul. Já sem esperanças, Saul sorri para um menino alemão que o observa. Pode ser um lamento cínico por esse pequeno ariano estar vivo e o menino judeu morto, ou então a esperança que o garoto não o delatará e não perpetuará o pensamento nazista.
Assistir a O Filho de Saul é uma experiência dura, mas não é nem um pingo no mar de horrores que as vítimas do holocausto viveram. O corajoso filme de László Nemes é importante para manter essa memória viva, a fim de que essas atrocidades nunca mais se repitam.
Ficha técnica:
O Filho de Saul (Saul fia, 2015) Hungria. 107 min. Dir: László Nemes. Rot: László Nemes, Clara Royer. Elenco: Géza Röhrig, Levente Molnár, Urs Rechn, Todd Charmont, Jerzy Walczak, Gergö Farkas, Sándor Szótér, Marcin Czarnik.
Assista: trailer do filme O Filho de Saul