O filme O Gênio e o Louco conta como foi o árduo projeto de elaboração do primeiro dicionário de língua inglesa, o Oxford. O trabalho levou 44 anos até a publicação da primeira edição, em 1928.
Para garantir que a história de um dicionário possa se tornar um filme dramaticamente emocionante, o roteiro de O Gênio e o Louco se esforça em dar vida aos dois personagens principais desse processo. São eles: James Murray (Mel Gibson) e o Dr. William Chester Minor (Sean Penn). A construção da consistência de suas personalidades passa pela sedimentação de camadas de sentimentos internos, arrependimentos, relacionamento com outras pessoas e objetivos. Sem isso, a história se tornaria maçante.
A trama
Mesmo sem possuir uma formação acadêmica, James Murray consegue a posição de responsável pelo dicionário. Então, esse monstruoso desafio é por si só empolgante, e o espectador se anima quando o projeto começa a dar certo. No entanto, é com a exploração dos momentos dramáticos que o filme se sustenta.
A proposta de Murray é inovadora, baseada num conceito colaborativo onde todos os cidadãos de língua nativa inglesa podem contribuir enviando palavras para constar no dicionário, com as devidas citações em publicações impressas. Porém, o projeto somente ganha impulso quando o Dr. William Chester Minor começa a enviar suas volumosas contribuições.
Julgamento
Na parte inicial de O Gênio e o Louco, acompanhamos o julgamento do Dr. Minor, que cometeu um assassinato. Nesse aspecto, as imagens em flashback deixam claro que o médico sofre de paranoia, e isso o motivou a matar um inocente pai de família por engano. Sua instabilidade emocional provém do trauma da guerra civil, quando marcou a ferro quente o rosto de um soldado desertor.
No hospício, ao começar a contribuir para o dicionário de Murray, Dr. Minor ganha um sentido na vida que o ajuda a se curar. Contudo, ao procurar se redimir com Eliza (Natalie Dormer), a viúva do homem que matou por engano, começa com ela um relacionamento amoroso. Porém, sua consciência continua em conflito, e se martiriza por pensar que está traindo o coitado do homem que ele matou.
Logo, a trilha de Murray se complica com a recaída do Dr. Minor, ao mesmo tempo em que sofre ataque de acadêmicos da Oxford que querem puxar seu tapete. Assim, além de trabalhar arduamente no projeto, precisa convencer sua esposa que seu esforço valerá a pena. Então, diante de tantos obstáculos, Murray acaba sendo destituído do cargo.
Personagens densos
Pelas descrições acima, pode-se ter uma ideia de quão densos são esses personagens. E, os atores que os interpretam aproveitam o máximo essa profundidade. Mel Gibson e, principalmente, Sean Penn brilham nos papéis e reforçam a multidimensionalidade de Murray e do Dr. Minor. De fato, Penn está intenso, se transformando fisicamente e trazendo de dentro para fora as agonias de seu personagem.
Da mesma forma, Natalie Dormer também entrega uma atuação vigorosa, transpirando o sofrimento da viúva em variadas situações no filme. Aliás, O Gênio e o Louco dá o devido valor às mulheres, colocando a Srª Murray e Eliza como as responsáveis por salvarem o projeto do dicionário Oxford. Cada uma articula dentro de seu poder de alcance para desobstruir o trabalho dos homens que elas amam. Contudo, há uma restrição nesse quesito, porque o filme se perde um pouco na ação da esposa de Murray. Na verdade, ficamos sem saber o que ela propôs para o comitê da universidade. Então, não entendemos se foi isso ou a benção de Churchill que colocou o projeto novamente nas mãos de Murray.
Direção de Farhad Safinia
O diretor iraniano Farhad Safinia evita que este seu filme de estreia fique só no combate político de Murray contra os acadêmicos contrários a ele, e enxerta ação no longa-metragem sempre que o roteiro permite isso. Por isso, O Gênio e o Louco oferece as sequências do assassinato, do acidente com a porta do manicômio, cenas da guerra civil e o chocante tratamento médico experimental ao qual submetem o Dr. Minor.
Além disso, Safinia assina também o roteiro, em conjunto com Todd Komarnicki e o cineasta John Boorman, diretor de Amargo Pesadelo (1972). Os três escreveram o roteiro adaptando o livro “The Surgeon of Crowthorne: A Tale of Murder, Madness and the Love of Words”, escrito por Simon Winchester.
Enfim, O Gênio e o Louco valoriza o trabalho desses dois gênios e loucos. Com isso, é história e entretenimento que nos estimula a buscar novas palavras nos dicionários para aprendermos um verbete que desconhecemos.
