O filme O Outro Irmão constrói um clima de perturbadora convivência com a violência desde seus primeiros momentos.
Certarti chega a uma pequena cidade no interior da Argentina após o sanguinolento assassinato de sua mãe e de seu irmão pelo seu padrasto. O processo burocrático está sendo cuidado por um misterioso sujeito chamado Duarte. Este homem está interessado em dividir a indenização por serviços militares prestados que o governo pagará ao assassino, que se suicidou após o crime.
E as fortes imagens das vítimas no necrotério, exibidas a Certari para reconhecimento servem ao filme como a cena do chuveiro em Psicose. O impacto delas no espectador é tão forte que os diretores não precisam produzir novas sequências similares para manter a tensão.
Além disso, o diretor Israel Adrián Caetano reverte a maneira tradicional de apresentar os créditos. Ele coloca na tela os nomes dos atores principais e, só bem depois, o título e outros atores do elenco. Essa quebra da forma ajuda a compor a ideia de que algo está fora do normal.
Certati mora em Buenos Aires, mas não tem nada que o prende por lá. Era funcionário público, mas conseguiu ser demitido. Conseguiu é o termo correto, porque, como no Brasil, é preciso um motivo especial para ser mandado embora de um cargo concursado. Sem trabalho, resolve ficar na cidadezinha, para cobrar o dinheiro do governo e levantar uma grana vendendo velharias acumuladas por seu irmão na casa que Certati herdou dele. Como viveram separados por muito tempo, ele não tem nenhum elo sentimental com os parentes recém mortos.
Bandido
Enquanto Certati vai reconstruindo aos poucos sua vida por ali, descobrimos que Duarte não é só um trapaceiro, mas um bandido perigoso, capaz de sequestrar pessoas para pedir resgate. Quando sente vontade, ainda estupra seus reféns. O o cúmplice de Duarte nesses atos criminosos é o meio irmão de Certati, não de sangue, mas o filho da ex-mulher do seu padrasto.
A impressão a respeito de Duarte é que quanto mais se cava, mais sujeira aparece. A sua sordidez cresce até um golpe de valor alto, para o qual recruta também Certati. Como personagem, Certati parece indefinido, deixando-se levar pelo vilão, apesar de não confiar nele. Sente-se mais esperto que Duarte, mas progressivamente se afunda em suas mãos.
Somente um ato impetuoso poderá livrá-lo do bandido. Aliás, deve ser algo eventual, pois ele não possui capacidade para planejá-lo. É uma situação frustrante para o espectador, que não pode se identificar com um herói valente ou brilhante. Porém, essa situação está fortemente conectada com a intenção de quebrar as fórmulas batidas do gênero policial. É por isso que o final do filme chega a decepcionar. Afinal, a sua solução não depende de Certati, e sim da vontade de outro. Na verdade, é uma reviravolta não satisfatoriamente desenvolvida durante o filme.
Vale a pena assistir O Outro Irmão pelo desenrolar de sua estória. Contudo, o espectador não se sentirá plenamente contente com seu final.
Ficha técnica:
O Outro Irmão (El Otro Hermano, 2017) Argentina/Uruguai/Espanha/França, 112 min. Dir: Israel Adrián Caetano. Rot: Israel Adrián Caetano, Nora Mazzitelli. Elenco: Leonardo Sbaraglia, Daniel Hendler, Ángela Molina, Alian Devetac, Pablo Cedrón, Alejandra Flechner.