O diretor William Brent Bell, especialista em terror, não costuma decepcionar, nem surpreender. Entre outros filmes, ele dirigiu Boneco do Mal (The Boy, 2016) e Órfã 2: A Origem (Orphan Kill: First Kill, 2022), que não são ótimos, mas estão acima da média. Em seu novo trabalho, O Senhor do Caos (Lord of Misrule), ele se arrisca num horror que se desenvolve gradualmente, mais atmosférico que repleto de sustos. Provavelmente, para seguir o tom do clássico O Homem de Palha (The Wicker Man, 1973), de Robin Hardy, que lida com o mesmo tema: os rituais pagãos celtas em uma pequena vila britânica ou irlandesa.
A trama
Em O Senhor do Caos, Rebecca (Tuppence Middleton) e Henry (Matt Stokoe) vivem nessa pequena vila há oito meses. Mas se preocupam porque a filha Grace (Evie Templeton) ainda não se adaptou ao local. É o que eles dizem, pelo menos, pois a vemos bem entrosada com as outras crianças na festividade pagã anual que acontece agora. Com música, dança e fogueira, os moradores simulam a expulsão do ser demoníaco Gallowgog, para assim garantir boas colheitas. Porém, durante o evento, Grace desaparece. O filme, então, segue a saga de Rebecca para tentar descobrir o paradeiro da filha. O clima fica cada vez mais assustador porque os moradores começam a mostrar uma faceta sinistra que ela ainda não conhecia. Principalmente, a do influente Jocelyn Abney (Ralph Ineson), que invade a igreja da qual Rebecca é a pastora, no meio de uma missa.
Diante da ineficiência da policial local, Rebecca começa a investigar por conta própria. Logo, se intromete em estranhos costumes já estabelecidos, provocando a ira dos antigos moradores. A trama perde a oportunidade de alegar que a tradição pagã é uma tradição centenária, o que causaria um impacto maior. Restringe-se, na verdade, ao último acontecimento há 12 anos, que agora precisa ser repetido. O filme poderia também ser mais enfático em relação ao lado sombrio da comunidade, o que renderia um clima mais assustador que faz falta já que a narrativa tem desenvolvimento lento. Mais que a lentidão, a percepção de que tudo dará errado para a protagonista pesa demais, a ponto de travar o enredo que parece não ter mais para onde ir.
Terror de lenta maduração
Ainda bem que a boa conclusão destrava o filme. É quando a trama mergulha de vez no sobrenatural. Assim, constrói um eficiente confronto entre Rebecca e o assustador Gallowgog, num cenário de completa escuridão que tem funcionado bem no gênero terror desde Corra! (Get Out, 2017), de Jordan Peele. O som e a música, muito envolventes durante todo o filme, ganham ainda mais destaque nessa parte final, principalmente no hipnotizante tema do ritual. De ruim, se sobressai a estranha transição entre Rebecca no galpão sobrenatural para o campo do ritual com a fogueira. Além disso, o personagem do marido soa indefinido o tempo todo, revelando que foi negligenciado na elaboração do roteiro.
O Senhor do Caos, enfim, se destaca por investir nesse terror de lenta maduração, sem apelações para os sustos fáceis. Explora com dignidade o filão dos filmes sobre rituais pagãos.
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Ficha técnica:
O Senhor do Caos | Lord of Misrule | 2023 | 104 min | Reino Unido, Irlanda | Direção: William Brent Bell | Roteiro: Tom de Ville | Elenco: Tuppence Middleton, Ralph Ineson, Matt Stokoe, Rosalind March, Anton Valensi, Evie Templeton, Alexa Goodall, Robert Goodman, David Langham.
Distribuição: Diamond Films.
Assista ao trailer aqui.