“Os Amores de Pandora” só não caiu no esquecimento por causa de suas belas imagens, fruto do trabalho do fotógrafo Jack Cardiff.
O título original menciona, além da personagem de Ava Gardner (Pandora) um tal de holandês voador. Este, segundo uma lenda, foi condenado a velejar sozinho em um barco fantasma até encontrar uma mulher que o ame a ponto de morrer por ele. É este o cerne da história do filme, que esconde por trás de um drama romântico, esse conto fantástico.
No litoral da Espanha, em 1930, Pandora, ciente de seu poder sobre os homens, arrasa os corações e as mentes deles. Chegam a ponto de se embriagarem até a morte por não conquistarem seu amor. A nova vítima da sedutora é o piloto de corridas Stephen (Nigel Patrick). Assim, ele despreza a sincera paixão de Janet (Sheila Sim) e se curva aos mais absurdos pedidos de Pandora.
Pandora reina absoluta até encontrar o misterioso Hendrik van der Zee (James Mason), o velejador holandês que chega à pequena cidade litorânea. No primeiro encontro dos dois, ela se constrange por não conseguir seduzí-lo. Porém, o desenrolar da trama apontará para o destino relatado na antiga lenda.
O que o tempo castigou
O filme alterna pontos altos e baixos. O tempo feriu em parte a obra do roteirista e diretor Albert Lewin. Na verdade, sua carreira provou que sua maior habilidade estava nas letras e não na câmera. Por outro lado, o cabelo volumoso de Ava Gardner comprova que a estética mudou desde aquela época. Afinal, fica claro que Ava fica mais bela com cabelos presos, o que é o inverso do que pretendia o responsável por esse quesito. Por exemplo, note também a cena da tourada, na qual ela veste um pano sobre a cabeça.
Mas, além disso, soam ultrapassadas as sequências da corrida na praia, que usou o antigo recurso de aceleração da velocidade. Em outras, a câmera aparece trêmula demais, contrastando com outras tomadas mais elaboradas.
Direção de fotografia
Na verdade, a riqueza de “Os Amores de Pandora” repousa nas belíssimas imagens planejadas pelo artista da fotografia Jack Cardiff. Logo de início, destaca-se o enquadramento da abertura na paisagem da praia, logo ocupada pelo sino que soa como alarme para o acontecimento fatal de onde partirá a narração da estória. Aliás, a mais bela tomada também se encontra no primeiro terço do filme. É aquela à beira do precipício, quando o rosto de Pandora aparece deitado em primeiro plano, enquanto a figura de corpo inteiro de Stephen se encontra em segundo plano, de pé, revelando o poder da mulher sobre o pobre homem apaixonado.
Cardiff, além disso, retrata várias imagens noturnas com coloração estupenda. E enquadra geometricamente algumas sequências, fazendo o melhor uso do cenário, como na tourada, que marca um dos melhores momentos do filme, quando a dança do toureiro frente ao animal se torna uma trágica caçada.
A trama em si merece elogios, pois surpreende por se enveredar pelos caminhos da fantasia, quebrando a expectativa de um ordinário romance dramático. Infelizmente, o filme permitiu que algumas tolices permanecessem na tela, como a cena em que uma mulher planta bananeira após ser beijada por um homem. É necessário boa vontade para ignorar esses deslizes e se concentrar no trabalho de Jack Cardiff e na presença de Ava Gardner, para então apreciar a boa história.
Ficha técnica:
Os Amores de Pandora (Pandora and the Flying Dutchman, 1951) 122 min. Dir/Rot: Albert Lewin. Elenco: James Mason, Ava Gardner, Nigel Patrick, Sheila Sim, Harold Warrender, Mario Cabré, Marius Goring, John Laurie, Pamela Mason, Patricia Raine, Margarita D’Alvarez, La Pillina, Abraham Sofaer, Francisco Igual, Guillermo Beltrán.
Assista: entrevista com Ava Gardner no canal What’s My Line