O filme Pacarrete descreve poeticamente como a felicidade fica distante para quem escolhe ser extraordinário.
Como ponto de partida, o diretor Allan Deberton estreia em longas para o cinema com uma história baseada em uma habitante da sua cidade natal. Lá em Russas, no Ceará, vive Pacarrete, uma senhora que na sua juventude fez carreira como bailarina. Agora, aposentada, a comunidade a considera uma louca, pois ela anda sempre maquiada, bem vestida e com modos requintados, inclusive falando muitas frases em francês.
Além disso, Pacarrete ainda adora dançar. De fato, o filme se inicia com uma divertida cena em que ela dança na calçada em frente à sua casa. Os trejeitos da ex-bailarina que lembram o Carlitos de Charles Chaplin, juntamente com a música alegre, transformam em um momento mágico o que poderia, a princípio, parecer ridículo.
Quando, eventualmente, a prefeita resolve celebrar os 200 anos da cidade com uma grande festa, Pacarrete propõe se apresentar em uma dança de balé. Porém, a gestora acredita que ela vai ser vaiada pelo povo.
Marcélia Cartaxo
Notoriamente, a atriz Marcélia Cartaxo aproveita a riqueza dessa personagem principal e constrói uma Pacarrete vibrante. Ao interpretá-la, utiliza de uma voz estridente, alinhada com a necessidade da protagonista de gritar sempre, porque seu jeito afetado coloca obstáculos parar ser ouvida pelo povo local. Quase ninguém lhe dá atenção séria, nem mesmo as crianças que a atormentam tocando a campainha de sua casa e fugindo. Afinal, para a maioria da população, ela é louca.
Então, toda essa empolgação se choca com o total desânimo que toma conta dela, logo após ver distante seu sonho de se apresentar e de perder uma pessoa amada. Analogamente, o momento dessa perda contrasta com a música alegre que está tocando no rádio. Nessa bela cena, com câmera fixa filmando de cima, a protagonista se movimenta muito sem saber o que fazer. Assim, a escolha desse plano demonstra o impacto da morte, sem cair no melodrama.
A fantasia de Pacarrete
Ao se defrontar com a baixa qualidade das músicas apresentadas na festa da cidade, bem como do comportamento sem educação daqueles que urinam em sua calçada, só resta a Pacarrete a fantasia. Definitivamente, a sequência final assim sugere sua escolha, em uma deslumbrante cena em que ela se apresenta no palco de um teatro. Para a bailarina incompreendida, é o caminho que lhe resta. Afinal, se para ser felizes, devemos ser loucos, que loucos sejamos.
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