Pequenos Incêndios Por Toda Parte arrisca desagradar o público com personagens antipáticos e situações forçadas.
Antes de tudo, é importante ressaltar que Liz Tigelaar, a criadora da minissérie, adaptou o livro de Celeste Ng optando por definir a personagem Mia Warren como uma negra. Com isso, cria uma incômoda expectativa no espectador e torna sua conclusão previsível. Sem essa definição racial, o embate entre as duas protagonistas, Mia e Elena, se situaria no modo de vida oposto entre elas.
Mia e Elena
Por um lado, temos a dona de casa Elena, que abdicou de sua carreira e de sua verdadeira paixão. E por outro, Mia, a artista que precisa viver como uma nômade por ter sequestrado a filha que estava gerando como barriga de aluguel. Ambas possuem qualidades e defeitos, mas a questão da cor acaba por frustrar o público. Afinal, se espera que Mia seja mais agradável, como uma representante da raça negra enfrentando os privilégios dos brancos.
E Mia está longe de ser esse modelo de heroína. Além de ter cometido essa citada infração no passado, ela possui vários segredos e age de forma suspeita. Não é fácil compreender os motivos de ela aceitar trabalhar como empregada de Elena, depois de a princípio se sentir ofendida. Igualmente, sua decisão de ajudar a chinesa a lutar na justiça pela filha que abandonou leva ao público a mesma indignação que sente Pearl, a filha adolescente de Mia. E, apesar de ser idolatrada por Izzy, a filha revoltada de Elena, Mia nem sempre é agradável com ela.
Elena, por sua vez, vive a típica vilã de um melodrama, ainda mais com a inserção da questão racial na estória. De fato, cegada pela sua obsessão em mostrar para a sociedade local que sua família é perfeita, ela comete vários erros, e estraga os seus quatro filhos. Os dois mais velhos são os típicos modelos dos sonhos americanos. O primogênito é Trip, o atleta da escola conquistador de garotas, e a garota é Lexie, a loirinha bonitinha que se veste bem e que vai entrar nas melhores faculdades. Já os outros filhos são os losers Moody, tímido e desajeitado, e Izzy, que sofre bullying por se lésbica (a estória se passa nos anos 1990).
Análise
A conclusão de Pequenos Incêndios Por Toda Parte acaba confirmando o que o público espera desde o início, mas que a trama custa a entregar durante seus sete episódios antes do epílogo. É mais fácil compreender as más ações de Elena, frustrada pelas opções que tomou durante sua vida, do que as boas de Mia, cujo aparente altruísmo parece ser na verdade movido por egoísmo.
Acerca de outro aspecto, a estrutura dos episódios copia o que a série This Is Us apresenta com melhores resultados. Ou seja, nos prólogos, vemos um fato que aconteceu no passado e que repercutirá no presente, que é contado durante o capítulo. Porém, naquela série criada por Dan Fogelman, podemos sempre esperar alguma conexão surpreendente. E isso é algo que Pequenos Incêndios Por Toda Parte não entrega em nenhum capítulo. Pelo menos, sua conclusão recompensa o público pelo esforço em seguir a minissérie pelos seus frustrantes capítulos intermediários.
Ficha técnica:
Pequenos Incêndios Por Toda Parte (Little Fires Everywhere, 2020) EUA. 463 min em 8 episódios. Criado por Liz Tigelaar. Elenco: Reese Witherspoon, Kerry Washington, Rosemarie DeWitt, Lexi Underwood, Joshua Jackson, Jade Pettyjohn, Mega Stott, Gavin Lewis, Jordan Elsass, Lu Huang, Stevonte Hart, Geoff Stults, Colby French, Isabel Gravitt, Paul Yen.