O cinema explorou várias vezes os perigos de se desafiar a morte. Seja criando um novo ser a partir de restos mortais, como nas várias adaptações de “Frankenstein”, seja enganando a morte, como em Premonição (Final Destination, 2000). (Re)Nascer recorre ao tema pela linha da possibilidade científica de Mary Shelley, por mais remota que seja, em detrimento do mergulho no sobrenatural. Se é que se pode aproximar esse tema de um realismo, emana daí o tom sinistro e assustador deste longa de estreia da diretora novaiorquina Laura Moss.
O enredo traz a possibilidade de reviver uma pessoa que acabou de morrer. Quem tenta isso é a médica patologista Rose (numa interpretação assustadora de Marin Ireland). Como todo cientista maluco, essa sempre foi sua obsessão. Por isso, apropriadamente trabalha no necrotério de um hospital, aguardando a eventual chegada de um morto que se encaixe nos padrões do experimento que ela conduz em seu apartamento. E encontra a correspondência perfeita na menina Lila (A.J. Lister), de 6 anos.
O estabelecimento dessa situação no filme se sucede num ritmo alucinante. Revela as excentricidades da Drª Rose, junto com sua obstinação severa, em paralelo com a acelerada rotina da enfermeira Celie (Judy Reyes), que cria sozinha sua filha Lila. Certo dia, deixa a menina, doente, com a vizinha, mas os sintomas se agravam tragicamente.
O experimento
Após o choque inicial de descobrir o que aconteceu com o corpo de sua filha, Celie resolve colaborar com Rose. Afinal, isso dá a possibilidade de recuperar sua querida Lila. Mas, lembrando muito o desenrolar de “Frankenstein”, a médica e a mãe precisam de elementos cruciais para realizar o experimento. E eles se tornam cada vez mais mórbidos. Vão de sangue de porco a tecido fetal, e a origem deles descambam para o crime (vários crimes, aliás).
(Re)Nascer se mantém firme dentro do cenário científico. Portanto, não cede à tentação de criar o terror com os efeitos desconhecidos de trazer a menina de volta do mundo dos mortos. Lila não recupera sua consciência e age até violentamente com o porco de Rose – talvez sua alma já se tenha perdido, mas o filme não segue nessa linha. Prefere criar um mal-estar imenso com os detalhes (alguns extremamente próximos) de procedimentos médicos e dos experimentos de Rose. A insistência, na verdade, incomoda e se torna difícil para muitos espectadores olharem para a tela.
O flash forward
Um aspecto da direção de Laura Moss chama uma atenção especial. Por que ela usa um flash forward na abertura do filme? O modo como a filmou é exemplar, com closes extremos que não permitem ver quem são as pessoas em cena, desta forma criando a surpresa do espectador ao perceber que já viu isso antes quando o episódio acontece na história. Mas, por isso, não tem o efeito de um flash forward tradicional, que é o de mostrar uma situação por vir do enredo para que o público se sinta fisgado a descobrir como se chegou nesse ponto.
Talvez Laura Moss não encare o flash forward nessa concepção tradicional. Ou talvez esteja lançando um novo uso para ele. Em ambas as hipóteses, parece um recurso desnecessário de (Re)Nascer; o que não quer dizer muito, pois o flash forward não é essencial mesmo.
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Ficha técnica de “(Re)Nascer”:
(Re)Nascer | Birth/Rebirth | 2023 | EUA | 101 min | Direção: Laura Moss | Roteiro: Laura Moss, Brendan J. O’Brien | Elenco: Marin Ireland, Judy Reyes, A.J. Lister, Breeda Wool, Monique Gabriela Curnen, Grant Harrison, LaChanze, Rina Mejia.