No final do primeiro Resgate (Extraction, 2020), dirigido por Sam Hargrave, o mercenário Tyler, interpretado por Chris Hemsworth, cai num rio após ter sido duramente baleado por seus inimigos. Tudo indicava que havia morrido. Em se tratando de um filme de ação, porém, sabemos que não é bem assim que as coisas funcionam. O personagem está de volta então para um segundo longa, Resgate 2, produzido pela mesma Netflix, cheio de trilha igualmente genérica (parece até a mesma) e dirigida pelo mesmo Hargrave, como uma espécie de segunda chance (“vai lá e faz direito desta vez”).
Após ficar meses em coma, desacreditado, Tyler desperta de mau humor. Ele se instala, com a ajuda de sua equipe no longa anterior, num chalé isolado na Áustria, para descansar, recuperar sua condição física e pensar na vida.
Um personagem desses, contudo, não aguenta ficar parado com a insuportável musiquinha que o acompanha nesses momentos de calmaria. Precisa de adrenalina. É também o tipo de homem que atrai ação. Logo, é só esperar que seu momento de voltar aos socos e tiros irá chegar.
Paralelamente à sua recuperação, acompanhamos um mafioso da Geórgia que aguarda o irmão sair da prisão. Ele mata a sangue frio o governador que assinou o aumento da sentença do irmão contra a sua vontade. Manda e desmanda em todo mundo, e praticamente governa o país. Obviamente, Tyler entrará em colisão com essa máfia.
Sua missão é resgatar a irmã de sua ex-esposa, mantida em cativeiro junto com seus dois filhos, por ordem de seu marido, justamente o irmão mafioso que está preso. Mais uma vez, é um homem, escudado por uma mulher e o irmão dela, contra um exército.
Todos os códigos do gênero
Sabemos quais são os códigos desse tipo de filme: herói muito difícil de ser assassinado porque os bandidos atiram muito mal, personagem supostamente aliado que só atrapalha, ação que por vezes é filmada de forma a não dar para entender quem bate em quem (o sucesso de John Wick não serviu para mudar isso, pois é mais fácil filmar assim do que caprichar na coreografia), vilões com feições caricaturais de tão malvados (a lição de Hitchcock, que gostava de vilões charmosos, mais uma vez desrespeitada), país distante dos EUA, herói que não mata o vilão na primeira chance que tem (dentro da lógica da matança desse tipo de filme), entre outros mais sutis.
Esses códigos se tornaram clichês justamente porque ajudam a trama a ser mais envolvente para um número grande de espectadores, que prefeririam, em tese, pisar em terreno conhecido. Esses clichês podem até coexistir, total ou parcialmente, em um bom filme, embora seja raro um verdadeiramente bom que não saiba driblá-los ao menos de vez em quando.
Não precisava, certamente, abusar de todos os clichês temáticos e formais que estavam à mão. A trilha que já serviu a milhares de outros filmes é o de menos. Tudo, cada luta, cada diálogo, cada solução dramática segue uma fórmula já bem surrada, bem ao gosto das produções da Netflix. Quando uma mistura dessas sai boa, é porque algum milagre aconteceu.
Hemsworth é carismático, os cenários são interessantes e o nível de interesse do espectador para filmes de ação vai determinar se é possível ver até o fim ou não. A meu ver, dá, mas sem maiores expectativas. Quem encarar, verá um filme ainda mais arisco que o primeiro, mas só um pouco melhor.
O milagre aconteceria se Thor conseguisse pegar o seu martelo? Duvido.
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Ficha técnica:
Resgate 2 | Extraction II | 2023 | 122 min | EUA | Direção: Sam Hargrave | Roteiro: Joe Russo | Elenco: Chris Hemsworth, Golshifteh Farahani, Adam Bessa, Tornike Gogrichiani, Demetre Kavelashvili, Tornike Bziava, Giga Shavadze, Tinatin Dalakishvili, Daniel Bernhardt, Irakli Kvirikadze, Levan Saginashvili, Andro Japaridze.
Texto escrito pelo crítico e professor de cinema Sérgio Alpendre, especialmente para o Leitura Fílmica.