A Call Girl (Slovenka, 2009), também conhecido por outro título em inglês, Slovenian Girl, reflete a percepção dos eslovenos pela entrada do país na Zona Euro. A mudança provocou grandes impactos na vida de um povo acostumado com o socialismo da Iugoslávia, ao qual pertenceu entre 1945 a 1990. Enfim, é o que mostra o recorte que o diretor Damjan Kozole leva aqui para as telas.
O enredo
O novo ideal capitalista logo influencia a jovem de 22 anos Alexandra (Nina Ivanisin). A princípio, a garota do interior se muda para a capital Liubliana para estudar. Mas, leva uma vida dupla, prostituindo-se em segredo com anúncios no jornal que publica sob o pseudônimo “Slovenka”. Aparentemente, parece um meio fácil de ganhar dinheiro, e isso alimenta seu consumismo materialista. Assim, adquire um apartamento transado através de um financiamento, e compra futilidades – o filme exemplifica isso com um grande vaso com iluminação dentro. No entanto, Alexandra vê esse falso sonho virar dura realidade quando cafetões violentos exigem que ela trabalhe para eles. Ela foge deles, mas fica um tempo fora do circuito, e logo tem dificuldade para pagar as parcelas do financiamento do seu imóvel.
Edo (Peter Musevski), o pai de Alexandra, representa a vida alternativa que não tem mais espaço no capitalismo. Apesar da idade, ele ainda retoma sua antiga vida de músico, e volta a tocar com sua banda em bares locais. Alexandra o trata com carinho, mas vê com desdém a falta de ambição do seu pai. Ao longo da história, o filme indica a forte conexão entre esses dois personagens. Sutilmente, através da mania dos dois de passar o cigarro pelos lábios antes de acendê-lo. Mas, com mais evidência na conclusão, quando a filha vai a uma apresentação da banda do pai, após ela perder tudo que conquistara com os ganhos da sua prostituição. O pai canta “Bobby Brown Goes Down”, de Frank Zappa, e ela acompanha junto com o público as letras que criticam o capitalismo, o “sonho americano” da canção.
Efeitos do capitalismo
Realizadoà época do ingresso da Eslovênia na Zona Euro, A Call Girl registra o efeito do capitalismo em seu povo. Alguns, como a protagonista Alexandra, viam a novidade como um mar de oportunidades, mas outros se sentiam incomodados com a mudança. No filme, esse incômodo se configura nas recorrentes passagens de carros policiais com sirenes ligadas escoltando alguma delegação europeia.
O deslumbramento de Alexandra não significa que o filme a caracterize como uma pessoa ingênua. Na primeira cena, quando um dos clientes está no chão sofrendo um enfarto por overdose de Viagra, ela avisa o hotel, mas retira da carteira dele o seu pagamento antes de fugir do local. Em momento posterior, ela tenta seduzir seu professor da universidade para ser aprovada na matéria dele. Diante dos reveses, vemos seus momentos íntimos de reflexão. Contudo, sem que eles tenham a finalidade de provocar a compaixão do espectador. Independente da prostituição, acompanhamos uma jovem em processo de amadurecimento.
Por outro prisma, é possível enxergar Alexandra como representação da própria Eslovênia. O jovem país parecia deslumbrado com as oportunidades da Zona Euro. Nesse sentido, o pai de Alexandra seria comparável à Iugoslávia, de quem o país se tornou independente, mas mergulhou em grave crise econômica.
O diretor Damjan Kozole realizou seu primeiro longa em 1986, e se tornou um dos mais notáveis representantes do renascimento do cinema esloveno. Seu filme Spare Parts (Rezervni deli, 2003) concorreu ao Urso de Ouro em Berlim, e ganhou prêmios em outros festivais.
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Ficha técnica:
A Call Girl / Slovenian Girl | Slovenka | 2009 | Eslovênia, Alemanha, Sérvia, Croácia, Bósnia e Herzegovina | Direção: Damjan Kozole | Roteiro: Damjan Kozole, Matevz Luzar, Ognjen Svilicic | Elenco: Nina Ivanisin, Peter Musevski, Primoz Pirnat, Marusa Kink, Uros Fürst, Dejan Spasic.