A história é forte, mas o filme Uma Noite de 12 Anos falha ao retratá-la.
Uma Noite de 12 Anos leva para as telas a prisão política decretada pela ditadura militar uruguaia em 1973, centrando em três personagens: Mauricio Rosencof e Eleuterio Fernández Huidobro, autores do livro que deu origem ao filme, e José Mujica, o futuro presidente do país. Os três membros do grupo revolucionário Tupamaros permaneceram encarcerados em solitárias durante doze anos.
O filme tenta descrever o tratamento desumano que esses prisioneiros receberam, sendo transferidos de local quase anualmente. Muitas dessas prisões eram absurdamente improvisadas, os presos passavam fome e sede, e não podiam se comunicar com ninguém.
Memórias do Cárcere
O longa-metragem retrata bastante as condições do cárcere, porém, evita escancarar as torturas que os protagonistas receberam. Essas entram em uma sequência de montagem com flashes rápidos, sem explicitar os horrores das sessões de coleta de confissões. Algumas cenas de flashbacks e fantasia são usadas como recurso para ilustrar o sentimento agonizante deles, e isso funciona.
No entanto, o diretor Álvaro Brechner erra em outros aspectos. Primeiro, talvez influenciado por seu filme anterior, Sr. Kaplan (2014), insere um pouco de humor, na cena do banheiro em que os militares escalam até o posto mais alto uma simples decisão sobre soltar as algemas do preso para que ele possa usar a privada. Essa pitada de comédia não combina com o tom do filme, nem com seu tema, e parece totalmente deslocada.
Brechner, também roteirista, se esforça por inserir no filme vários relatos sobre o encarceramento presentes no livro de Rosencof e Huidobro. Então, entram uma série de acontecimentos inusitados, como as cartas de amor escritas por Rosencof para ajudar o militar a conseguir conquistar uma mulher, a situação do banheiro comentada acima, a visita inútil da Cruz Vermelha, a insistência em lavar todas as panelas antes de sair livre etc.
Os protagonistas
Contudo, essa preocupação excessiva em incluir esses incidentes se sobrepõe àquela de conquistar a empatia do público pelos seus personagens principais. Rosencof, Huidobro e Mujica dividem o protagonismo do filme e nenhum é aprofundado o suficiente. Além de não aproximarem o espectador, este até se confunde em distinguir quem é quem, pois suas personalidades não são desenvolvidas. Com certeza, eles possuem características próprias diferentes na vida real, mas elas não estão na tela.
Talvez para o público uruguaio, isso não seja um problema, pois eles já conhecem essas figuras públicas fora do filme. Porém, para o espectador estrangeiro, até o uso de apelidos – Ruso, Pepe, Ñato – dificulta a distinção.
Uma Noite de 12 Anos desperdiça, também, a construção de um vilão. O chefe militar que persegue Mujica se oferece para esse papel, mas o filme não aproveita essa figura desprezível para criar um oponente assustador que daria mais emoção ao filme.
A história retratada em Uma Noite de 12 Anos merece ser relembrada para que não se repita. Esse é o grande mérito do filme. Porém, poderia ser uma experiência cinematográfica mais impactante.
Ficha técnica:
Uma Noite de 12 Anos (La Noche de 12 Años, 2018) Uruguai/Argentina/Espanha. 122 min. Dir/Rot: Álvaro Brechner. Elenco: Antonio de la Torre, Chino Darín, Alfonso Tort, César Troncoso, Soledad Villamil, Sílvia Pérez Cruz, Mirella Pascual, Nidia Telles.