Zeros e Uns (Zeros and Ones) nos deixa com a incômoda impressão de que Abel Ferrara se apressou para lançar um filme que registrasse o histórico momento da pandemia da Covid-19. Na tela, percebemos que as filmagens principais aconteceram em locações em Roma durante a noite, com as ruas desertas e com personagens vestindo máscaras. Mas, apesar do prestígio do seu diretor e da presença do astro Ethan Hawke, parece que estamos diante de uma produção classe C. É uma filmagem suja, com câmera digital na mão, imagem granulada, sem iluminação adequada. Pode-se dizer até que se aproxima de um filme amador, embora, pela reputação de Ferrara, todos prefiram dizer que é experimental.
Todo esse improviso descamba numa narrativa confusa. Ethan Hawke vive dois papéis. O principal deles, J.J. é um soldado com uma missão na capital da Itália. Segundo a sinopse, ele deve impedir vários atentados programados para a noite que o acompanhamos. Mas, o que está na tela nos leva a crer que ele é o terrorista. Entre os eventos do filme, espiões russos o sequestram e tentam fazê-lo parecer um traidor. O outro personagem que Hawke interpreta é o seu irmão, um revolucionário que está preso e sob ameaça. É difícil entender se o destino do irmão está relacionado com a missão de J.J., mas este encontra a mulher e a filha dele e os ajuda.
Por fim, após cruzar a noite nessa missão, o filme apresenta o despertar da manhã. Pela primeira vez, saímos da escuridão e vemos o sol. Junto com ele, as pessoas estão nas ruas sem máscaras. Não são soldados, mas crianças e pessoas comuns reiniciando suas vidas. Pelo menos, fica evidente a intenção de concluir o longa com uma mensagem esperançosa.
Hawke explica
Zeros e Uns ainda chama a atenção para sua produção mal-acabada com as mensagens do próprio ator Ethan Hawke. Uma antes do filme, que ele gravou quando as filmagens ainda nem tinham se iniciado. E a outra depois de assistí-lo pronto, e Hawke tenta explicar um pouco do enredo. Os óculos tortos de Hawke exemplificam bem a falta de capricho geral na realização desse filme.
Enfim, Abel Ferrara pode jogar a culpa nas restrições impostas pela pandemia, mas nada ameniza o fato de ter feito um filme muito inferior ao seu anterior Sibéria (2020), que também era difícil de entender, mas recompensava com bom cinema.
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Ficha técnica:
Zeros e Uns | Zeros and Ones | 2021 | 87 min | Alemanha, EUA, Reino Unido, Itália | Direção e roteiro: Abel Ferrara | Elenco: Ethan Hawke, Cristina Chiriac, Phil Nelson, Valerio Mastandrea, Valeria Correale, Dounia Sichov, Babak Karimi.