Com 007 – Sem Tempo Para Morrer, chega ao fim a era do James Bond mais humanizado da franquia, vivido por Daniel Craig desde 2006. É uma despedida em grande estilo, com um inegável tom melancólico que evidencia que Bond vive sua última missão. Esse fechamento mantém o alto teor dramático que acompanhou o agente secreto nessa fase, que o mostrou como uma pessoa de verdade. Ou seja, que também apanha e sofre, inclusive das dores do amor.
Na verdade, o ator George Lazenby seguiria esse rumo, quando sucedeu a Sean Connery, que queria se distanciar da franquia. Em 007 – A Serviço Secreto de Sua Majestade (On Her Majesty’s Secret Service, 1969), o James Bond de Lazenby se casa, e vive o drama de se tornar viúvo. Porém, o público não aprovou, e Connery retornaria para mais um filme do 007. Logo depois, Roger Moore assumiria o papel.
A tradição e o rompimento
007 – Sem Tempo Para Morrer quebra o protocolo e se inicia com um flashback sem James Bond. Somente após esse trecho é que entra a tradicional abertura arrasadora com o agente fugindo da Spectre. Em seguida, o filme mantém os créditos iniciais, mesmo que isso não seja mais visto nas produções atuais. Mas, é a deixa para tocar a música tema do filme, “No Time To Die”, cantada por Billie Eilish.
Nessa trama, James Bond já está aposentado, e agora a sua numeração 007 pertence à agente Nomi. Porém, ele volta à ação a pedido de um amigo, Felix Leiter, que está preocupado com os rumos da MI6 e da CIA. E, logo volta a encarar o antigo inimigo Blofeld (Christoph Waltz), mas surge um novo vilão, com um plano que levará milhões de pessoas à morte. Seu nome é Lyutsifer Safin (Rami Malek).
Apesar de suas 2h43min, 007 – Sem Tempo Para Morrer não cansa. Afinal, como de costume, o filme traz muitas cenas de ação, em vários lugares belíssimos. Entre eles, Matera (Itália), Ilhas Faroé, Atlantic Road e Nittedal (Noruega), e Cairngorms National Park (Escócia). Em Cuba, Ana de Armas encarna a divertida e letal agente Paloma, uma bond-girl empoderada, que mostra seus dotes numa missão, e não na cama.
Herói vulnerável
No entanto, nesse filme, que beira a perfeição, dois momentos desaceleram perigosamente o ritmo, e podem dispersar a atenção do público. Eles acontecem nas duas acareações de Bond com os vilões. Primeiro, com o antigo rival Blonfeld na prisão, numa cena que lembra o encontro de Jodie Foster e Anthony Hopkins em O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs, 1991). Afinal, em ambos se teme que o superdotado vilão possa dominar a mente do herói. Depois, há a conversa com Lyutsifer Safin, no tradicional momento em que o malfeitor conta a sua motivação por trás de seu vil plano.
Um dos aspectos marcantes da era Daniel Craig é o abandono do herói imaculado. Bond age com violência, muitas vezes desmedida, usa sem parcimônia sua licença para matar, e desobedece a seus superiores. Aliás, nem mesmo o MI6 e a CIA são plenamente confiáveis, já que os governos que os comandam visam interesses políticos e econômicos. Por isso, o agente quer a aposentadoria. Emblematicamente, demora para ele assumir sua posição e dizer que se chama “Bond, James Bond”. Antes, ao conhecer Nomi, ele se apresenta como “James, apenas James”.
Bond nunca superou a morte de Vesper Lynd. A desconfiança que sentiu dela ainda o atormenta e atrapalha o novo amor, por Madeleine Swann (Léa Seydoux retornando ao papel). Com essas duas mulheres, o perdão, ou melhor, o arrependimento vem tarde demais. Ao contrário do que canta Louis Armstrong na canção que fecha o filme, ele não tem todo o tempo do mundo. Como não poderia ser diferente, o desfecho dessa era é triste, o mais doloroso de todos os filmes com James Bond.
O amanhã nunca morre
Assim, Daniel Craig se despede do papel definitivamente, na cena mais dramática do melhor filme em que ele viveu esse personagem. Com Bond, nunca se deve dizer nunca, mas, desta vez, não há volta. Um novo 007 deverá surgir – ou melhor, talvez já tenha surgido no próprio 007 – Sem Tempo Para Morre.
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Quem são as duas novas agentes no filme?
007 – Sem Tempo Para Morrer apresenta duas novas agentes aliadas a James Bond. Uma delas é a altamente talentosa, ligeiramente convencida, Nomi (Lashana Lynch). A outra, é a intensa agente cubana Paloma (Ana de Armas). Aliás, elas são dois dos exemplos de mulheres fortes e duronas no filme.
O diretor Cary Joji Fukunaga
Para levar às telas esse espião britânico, com vivência cosmopolita, ninguém melhor que um diretor com ascendência japonesa e sueca. O pai de Cary Joji Fukunaga nasceu em um campo de internamento para japoneses nos EUA, durante a Segunda Guerra Mundial. Já a mãe era uma sueca-americana. Então, ele não era nem branco nem asiático, mas, essa origem multirracional sempre deixou o diretor orgulhoso.
Fukunaga estudou História e Ciências Sociais, porém, se preparou para o cinema na NYU Film School. Então, despontou com uma adaptação de Jane Eyre (2011), com Mia Wasikowska e Michael Fassbender no elenco. Em seguida, dirigiu a primeira e melhor temporada da série True Detective em 2014. Então, a Netflix o chamou para dirigir Beasts of No Nation (2015), primeiro filme da empresa visando prêmios, e a minissérie Maniac (2018), estrelada por Jonah Hill e Emma Stone. Dessa forma, pavimentou seu caminho para chegar ao filme de James Bond.
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Ficha técnica:
007 – Sem Tempo Para Morrer | No Time to Die | 2021 | Reino Unido, EUA | 163 min | Direção: Cary Joji Fukunaga | Roteiro: Neal Purvis, Robert Wade, Cary Joji Fukunaga, Phoebe Waller-Bridge | Elenco: Daniel Craig, Ana de Armas, Dali Benssalah, David Dencik, Ralph Fiennes, Naomie Harris, Rory Kinnear, Lashana Lynch, Billy Magnussen, Rami Malek, Léa Seydoux, Ben Whishaw, Jeffrey Wright.
Distribuição: Universal.
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