O filme 438 Dias chega em momento oportuno às plataformas digitais. Afinal, o seu tema motivou o Nobel da Paz deste ano, que premiou os jornalistas Maria Ressa e Dmitry Muratov por defesa da liberdade de expressão.
Com base no livro dos próprios personagens principais de 438 Dias, o roteiro de Peter Birro conta o incidente da prisão dos jornalistas Johan Persson e Martin Schibbye na Etiópia. Utilizando provas forjadas, as autoridades queriam evitar que eles investigassem o envolvimento da empresa Lundin Oil na região de Ogaden. A acusação alegou que Persson e Schibbye estavam envolvidos com o grupo de guerrilheiros rebeldes da ONLF, e foram condenados a onze anos de prisão por terrorismo. Acima de tudo, o que complicou a situação foi a participação do Ministro das Relações Exteriores da Suécia, antes um diretor da Lundin Oil.
O último trabalho do diretor sueco Jesper Ganslandt tinha sido o filme policial Carga Mortal (Beast of Burden, 2018). Com Daniel Radcliffe (o Harry Potter) como protagonista, essa produção estadunidense foi mal recebido pelo público, o que fez Jesper Ganslandt retornar para seu país natal. Dessa vez, em 438 Dias, mostra competência ao levar para as telas essa chocante história.
Sem explorar o sensacionalismo
A princípio, o subtítulo* do livro de Johan Persson e Martin Schibbye indica um conteúdo violento, pois menciona a tortura. Porém, o filme possui um tom mais moderado. Os trechos intensos mostram a abordagem truculenta dos soldados etíopes, que acabam ferindo os jornalistas com tiros. E, depois, na simulação da execução sumária, para conseguir que eles declarem que entraram ilegalmente no país com a ONLF.
Além disso, o presídio onde eles são confinados causa impacto, pois o filme revela que dentro dos altos muros, os condenados sobrevivem sem nenhuma vigilância dos guardas. Ou seja, é cada um por si. Felizmente para os protagonistas, eles conseguem se relacionar bem com os demais presos.
438 Dias pode soar morno para quem espera um filme sobre prisão – por exemplo, Papillon, recentemente refilmado em 2017. Isso porque seu realizador, Jesper Ganslandt, evita o sensacionalismo. Em outras palavras, ele não aumenta os fatos nem exagera no drama. Afinal, os eventos já são dramáticos por si. O roteiro é consistente, e ganha força com o elemento clássico do personagem secundário que faz a diferença no destino dos protagonistas. No caso, o operador de câmera que, desde sua primeira aparição na tela, se mostra desconfortável com a situação que está registrando pelas suas lentes.
Felizmente, Johan Persson e Martin Schibbye escaparam para contar a sua história. Mas, outros, como o fotojornalista Gilles Caron retratado em História de Um Olhar (2019), não tiveram a mesma sorte. Por isso, 438 Dias é um filme importante, para que governos autoritários e interesses de grandes corporações não suprimam a liberdade de expressão.
* “How our quest to expose the dirty oil business in the Horn of Africa got us tortured, sentenced as terrorists and put away in Ethiopia’s most infamous prison.”
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Ficha técnica:
438 Dias | 438 dagar | 2019 | Suécia | 124 min | Direção: Jesper Ganslandt | Roteiro: Peter Birro | Elenco: Gustaf Skarsgård, Matias Varela, Faysal Ahmed, Josefin Neldén, Stephen Jennings, Jesper Ganslandt, Philip Zandén, Graham Clarke.
Distribuição: A2 Filmes.