A comédia francesa A Boa Esposa transita entre vários gêneros para divertir o público com a anacrônica constatação de que. no final dos anos 1960, ainda existiam escolas que preparavam jovens mulheres para serem boas esposas.
O filme retrata uma escola dessas, de propriedade do casal Paulette e Robert Van Der Beck. Em 1968, a quantidade de alunas caiu pela metade, e as novas inscritas já não aceitam com tanta facilidade as várias regras que o curso ensina. É um sinal dos tempos revolucionários, evidenciado pelo rádio que noticia as várias manifestações de jovens em Paris.
Essencialmente, a graça do filme se encontra nas hoje consideradas absurdas normas de conduta para ser uma boa esposa. Por exemplo, uma das mais obsoletas que vemos consiste em como servir o chá em uma ocasião especial. Ainda dentro dessa visão quase caricatural do machismo da época, se inclui a reprovável compulsão do diretor da instituição que espionava as jovens alunas.
E esse personagem serve como a ignição para a mudança de atitude da diretora Paulette, papel de Juliette Binoche. Afinal, quando ele morre, a viúva decide ceder ao cortejo de um antigo namorado, André Grunvald, e percebe o quanto foi infeliz em seu casamento. Essa transformação a levará a aderir aos movimentos feministas que explodem na capital. Ademais, percebe que sua escola não faz mais sentido. Com isso, abre-se a oportunidade para uma inesperada conclusão em formato musical.
Outros gêneros
Porém, antes disso, o filme envereda por outros gêneros. O drama, por exemplo, dá suas caras na tentativa de suicídio de uma aluna. Nesse ponto, critica o costume dos casamentos arranjados, que origina a profunda tristeza dessa garota.
O romance também ganha seu espaço. Não só no florescer tardio do amor de Juliette, mas também na primeira experiência sexual de uma aluna com seu namorado, e na tentativa da menina lésbica em conquistar sua amiga.
Aliás, vale destacar que o filme reúne um grupo interessante de personagens secundários. Há uma gama diversificada de alunas com características bem distintas. Além disso, temos a freira exageradamente rígida e a cunhada recalcada. Porém, A Boa Esposa não aprofunda esses personagens e, assim, desperdiça o potencial dramático delas, principalmente dessas jovens.
Por outro lado, a repentina reviravolta da protagonista Juliette não convence. Para engolir essa ideia, só mesmo aceitando que o filme se torna uma comédia quase maluca. Dessa forma, podemos nos divertir quando ela e André rolam pela grama no campo, como dois amantes juvenis. Ou quando André desastradamente tenta escalar o sobrado de Juliette.
No entanto, a chave principal de A Boa Esposa é a abordagem crítica desses tempos machistas, com a perspectiva de hoje. Nesse sentido, o filme pode até empolgar no panfletário trecho musical no final.
Elenco e direção
Sob outro aspecto, vale a pena ver aqui Juliette Binoche em um papel leve e divertido, ao invés de num drama. Aliás, a atriz parece bem à vontade, até mesmo no segmento musical em que também canta.
Por fim, este é o sétimo longa do diretor francês Martin Provost. Talvez, você o conheça por O Reencontro (2017), estrelado por Catherine Deneuve e Catherine Frot. Sobre este novo filme, o cineasta explica:
“No final dos anos 60, escolas de economia doméstica que, por mais de cem anos, tinha treinado exércitos de donas de casa, governantas e babás em toda a França estavam vivendo seus últimos anos. Era o fim de uma era, uma em que ainda existia um tipo de educação reservado estritamente para meninas. Seu único objetivo era confiná-las à arena doméstica com nenhuma perspectiva além da de servir homens e famílias. Lá, jovens estudantes de origens humildes aprenderam a gerenciar uma casa e um orçamento, consertar cucas e meias de seu marido, bem como matar um coelho, rechear uma ave etc…
De fato, havia tantas dessas escolas de economia doméstica que parece incrível pensar que nenhuma sobreviveu ao maio de 1968. Algumas foram transformadas em escolas agrícolas, mas outras foram apagadas da paisagem francesa completamente em menos de dois anos.”
– Martin Provost
Onde assistir?
Gostou? Então, anote: A Boa Esposa estreia nos cinemas com distribuição da California Filmes, em 17 de junho de 2021. Antes, entrou na programação do Festival Varilux de Cinema, em dezembro de 2020.
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Ficha técnica:
A Boa Esposa (La bonne épouse) 2020, França, 109 min. Direção: Martin Provost. Roteiro: Martin Provost, Séverine Werba. Elenco: Juliette Binoche, Yolande Moreau, Noémie Lvovsky, Edouard Baer, François Berléand, Marie Zabukovec.
Distribuição: Califórnia Filmes.
Trailer: