A Fita Branca é mais um ensaio sobre a violência criado pelo diretor alemão Michael Haneke. Desta vez, ele retrata o microcosmo de um vilarejo no interior da Alemanha em 1914, um pouco antes do início da Primeira Guerra Mundial. O filme possui narração na voz já idosa de um dos moradores do local, que comenta que os eventos que assistiremos talvez possam esclarecer o que aconteceria no país.
Assim, a narração nos conduz por alguns fatos estranhos. O primeiro deles acontece na primeira cena do filme, quando o médico local chega cavalgando e um arame derruba o seu cavalo, machucando o homem gravemente. Depois, o filho do barão desaparece e é encontrado amarrado de cabeça para baixo. O celeiro do barão também é alvo desses ataques, sendo incendiado. E, por fim, o filho com problemas mentais da parteira sofre uma surra quase mortal.
A violência se encontra também dentro das casas. O filme mostra pais exageradamente rigorosos, que exigem disciplina extrema e punem com castigos físicos as crianças desobedientes. Há até o caso de um pai que molesta sexualmente a filha de 14 anos.
Sem banalizar a violência
A Fita Branca aborda a violência sem nunca a banalizar. Por isso, nenhuma cena mostra os atos violentos. Por exemplo, quando o pai castiga o filho com uma vara, a porta está fechada e só ouvimos alguns gritos. A intenção do filme é criticar a violência e indicar como essa educação agressiva possui efeitos negativos na juventude.
A narração possui eloquência e riqueza de detalhes que se aproximam de uma narrativa literária. Lembram os filmes de François Truffaut, que também possuíam essa qualidade que convida o espectador a prestar atenção na voz em off.
Sem explicitar claramente os culpados pelos incidentes criminosos, A Fita Branca leva o espectador a concluir que foram as próprias crianças que praticaram esses atos. A menina que era molestada pelo próprio pai tinha motivos suficientes para atacá-lo. O ataque ao filho do barão deve ter origem no primogênito do seu empregado que acreditava que o chefe foi o responsável pela morte da mãe. E esse grupo de jovens provavelmente praticou em conjunto a agressão ao menino com deficiência. Com isso, o filme indica que a educação que essas crianças recebiam em casa contribuía nessa tendência à violência.
Aliás, essa conclusão é corroborada pelo filme Violência Gratuita (1997), onde Michael Haneke já colocava dois jovens praticando a violência sem entender as consequências de seus atos.
Preparando os jovens alemães
Assim, o recorte abordado em A Fita Branca, dentro de uma comunidade pequena, ecoa no que se passou na Alemanha, como o narrador indica na sua abertura. Inadvertidamente, a sociedade preparava os jovens para se alinharem aos ideais fascistas que a maioria abraçaria anos depois. E o título do filme se refere a esse fenômeno, pois a fita branca representa a inocência. O pastor do filme coloca a fita branca em seus filhos para essa identificação, mas depois perceberá que eles já perderam a inocência.
E A Fita Branca mostra a perda da inocência de todo o país, a partir do microcosmo do vilarejo. Estávamos às vésperas da guerra mais sangrenta da história e algumas décadas antes do nazismo.
Grande vencedor no Festival de Cannes de 2009, A Fita Branca mantém a atenção pela bela narração do professor do vilarejo, e pela rápida sucessão de fatos que constroem esse cenário para uma violência ainda maior que estava por vir.
Ficha técnica:
A Fita Branca (Das weiße Band – Eine deutsche Kindergeschichte, 2009) Alemanha/Áustria/França/Itália/Canadá. 144 min. Dir/Rot: Michael Haneke. Elenco: Christian Friedel, Ernst Jacobi, Leonie Benesch, Ulrich Tukur, Ursina Lardi, Fion Mutert, Michael Kranz, Burghart Klaußner, Steffi Kühnert, Maria Dragus, Leonard Proxauf, Levin Henning, Johanna Busse, Thibault Sérié, Janina Fautz, Enno Trebs, Rainer Bock, Susanne Lothar, Roxane Duran, Detlev Buck, Marisa Growaldt.
Sony Classics