Mais um serial killer real vira filme, desta vez sob as lentes da atriz Anna Kendrick, estreando na direção. O assassino retratado é Rodney Alcala, que foi condenado pela morte de cinco mulheres, embora seja suspeito de ter feito centenas de vítimas. Em A Garota da Vez, quem o interpreta é Daniel Zovatto, que recentemente viveu o Padre Esquibel em O Exorcista do Papa (2023).
A não-linearidade da narrativa serve para demonstrar que Rodney cometeu vários assassinatos durante os anos 1970. Atraía suas vítimas com sua lábia convincente, geralmente com o pretexto de tirar fotos com elas como modelos – a primeira morte que acontece no filme, em Wyoming em 1977, ilustra esse seu modo de operar. A cena revela uma bizarrice do psicopata: com uma respiração boca-a-boca, ele revive a garota que estava desacordada após ele estrangulá-la, para então matá-la em definitivo. Mas é uma atitude que não se repete nos demais assassinatos, como também acontece com o fato de ele cair no choro depois de estuprar e agredir uma adolescente.
Detalhes
Ao que parece, o roteiro tenta inserir detalhes que as investigações ou os testemunhos levantaram sobre Rodney Alcala, mais com intenção de ser fiel aos fatos do que incrementar a narrativa fílmica. Além de detalhes, dados mais relevantes para o longa igualmente devem ter surgido dessa maneira.
O próprio episódio que envolve Anna Kendrick segue essa linha. A diretora e atriz faz o papel de Sheryl, uma aspirante ao sucesso em Hollywood em 1978 que aceita participar de um programa de encontros transmitido ao vivo pela televisão. Por mais estranho que possa parecer, Rodney Alcala é um dos três candidatos a namorar com Sheryl. Belo pretexto para o filme segurar o espectador para descobrir se ela será a vítima da vez do serial killer. E novamente o cinema coloca num programa de TV ao vivo dos anos 1970 um representante do mal, repetindo o recente Entrevista com o Demônio (2023).
Essa narrativa de Sheryl gera dois momentos de suspense. Um com a personagem Laura (Nicolette Robinson), que reconhece o assassino que está no palco e tenta avisar a produção. O outro quando Sheryl tenta chegar até o seu carro no estacionamento do estúdio com Rodney em seu encalço. Mas essas duas sequências ficam mais na expectativa e não geram tanta tensão quanto poderiam.
Ainda em relação à preocupação em inserir detalhes reais no enredo, tem também o novo colega de trabalho que Rodney tenta atrair para uma de suas fatais sessões de fotos. O roteirista Ian McDonald achou essencial citar que Rodney também pode ter matado homens. Mas colocou isso na trama sem acrescentar muito para a estória. Uma foto no álbum do assassino confirma que o rapaz posou para ele, porém, seria mais interessante criar uma cena com esse assassinato.
Kendrick diretora
Anna Kendrick, como diretora, opta por não mostrar violência demais na tela. Nos assassinatos, evita uma incisiva câmera subjetiva seja do criminoso ou de suas vítimas. Na primeira morte, a câmera está distante dentro do carro, e depois entram os closes na citada respiração boca-a-boca. Na cena de outra vítima, a câmera filma de cima, através da claraboia. Em outros casos, como o da amiga de Laura e da adolescente Amy (Autumn Best), a diretora não mostra o ato criminoso, optando pelo fato já consumado. Não deixa de ser uma escolha válida, pois o explícito não é mandatório para criar tensão – se fosse, os clássicos do suspense estariam todos datados.
Aparentemente, essa escolha combina com a personalidade da realizadora. Tanto que um dos momentos mais empolgantes de A Garota da Vez não envolve suspense. É quando Sheryl, seguindo o conselho da maquiadora do programa de encontros, usa toda a sua sagacidade para desmontar os três candidatos. O truque funciona para desmascarar o bobão e o mulherengo, mas não o ardiloso psicopata. Essa sequência é cativante, principalmente porque coloca a protagonista como um estandarte do poder feminino numa época tão machista (algo que o filme enfatiza desde que que Sheryl aparece em cena). E Anna Kendrick se mostra muito à vontade nesse trecho, talvez aproximando a sua personagem de um alter ego seu.
Fica, então, a dúvida. Apesar de o roteiro do novato Ian McDonald se preocupar demais em inserir os dados da sua pesquisa na trama, Anna Kendrick constrói em sua estreia como diretora um competente filme de suspense. Mas, ela não se daria melhor em outro gênero, com a qual ela se identifique mais?
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Ficha técnica:
A Garota da Vez | Woman of the Hour | 2023 | 95 min | EUA | Direção: Anna Kendrick | Roteiro: Ian McDonald | Elenco: Anna Kendrick, Daniel Zovatto, Tony Hale, Nicolette Robinson, Pete Holmes, Autumn Best, Kathryn Gallagher, Kelley Jakle.
Distribuição: Diamond Films.
Trailer:
