O ator Brad Corbet estreia na direção com esse ousado A Infância de um Líder (The Childhood of a Leader). A ousadia maior está no estilismo, pois Corbet recorre a diversos maneirismos para contar sua história. Nesse sentido, vai desde montagem de registros históricos ao plano-sequência. E culmina num desfecho que beira o experimental – ou seja, imagens desfocadas e câmera como se filmasse a esmo. Junte a isso a bombástica trilha musical de Scott Walker, que abre o filme com o nervosismo de Bernard Herrmann e depois só retorna quase uma hora depois. Se, por um lado, esse estilismo instiga o espectador por conta de sua imprevisibilidade, por outro torna enigmática a sua narrativa.
Aliás, a história de A Infância de um Líder também é ousada, embora não tão criativa no cinema. Já na literatura são outros quinhentos, pois se baseia em conto de Jean-Paul Sartre. Mas o filme lembra A Fita Branca (Das Weiβe Band, 2009), de Michael Haneke, que também propõe explicar a origem do fascismo na Europa a partir das crianças.
Um menino nada doce
No filme de Corbet, o foco está em Prescott (Tom Sweet), um menino de onze anos filho de um diplomata americano (Liam Cunningham) vivendo temporariamente na França a fim de representar o governo dos EUA nas negociações após o fim da Primeira Guerra Mundial. Intransigente, Prescott domina a mãe (Bérénice Bejo), aproveitando-se da pouca presença do pai nos assuntos familiares. Logo, a semente do futuro fascista brota quando ele aprende a usar o poder. Isso acontece no momento em que a governanta, que fazia as suas vontades às escondidas, é demitida pela mãe. Assim, como exercício de uso do poder, Prescott provoca a dispensa de sua tutora (Stacy Martin).
Esse jogo de manipulação representa os momentos mais fortes do filme. O garoto realmente reúne as características que o tornam atrativo como o belo Tadzio de Morte em Veneza (Morte a Venezia, 1971), de Luchino Visconti, detestável como as crianças de Nanny McPhee (2005), de Kirk Jones, e amedrontador como o Damien de A Profecia (The Omen, 1976), de Richard Donner. Esse ambiente de constante confrontamento já renderia um bom filme, independente das pretensões mais profundas de relacionar com o fascismo.
Enigmático
Mas é nessa analogia que A Infância de um Líder se torna demasiado enigmático. As referências não são evidentes – aliás, o roteiro de Brady Corbet e Mona Fastvold não se baseia em um fascista específico da História. Assim, fica difícil compreender o papel do pai em suas negociações com representantes de outros países. E muito menos o nexo causal dessas reuniões internacionais com o garoto Prescott. Para confundir ainda mais, não sabemos quanto tempo decorre até a conclusão do filme, que ainda traz Robert Pattinson em um talvez segundo papel na trama.
Colocando a forma acima do conteúdo, A Infância de um Líder revela um diretor autoral, como comprovaria seu segundo longa, o superior Vox Lux (2018), que repete a escalação de Stacy Martin, o marcante compositor Scott Walker, e a segmentação da narrativa em capítulos. Sem dúvida, um diretor a ser observado.
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Ficha técnica:
A Infância de um Líder | The Childhood of a Leader | 2015 | 115 min | EUA, Canadá, Reino Unido, França, Hungria, Bélgica | Direção: Brady Corbet | Roteiro: Brady Corbet, Mona Fastvold | Elenco: Bérénice Bejo, Liam Cunningham, Stacy Martin, Yolande Moreau, Jacques Boudet, Robert Pattinson, Tom Sweet, Sophie Lane Curtis, Rebecca Dayan.