Uma professora de violino chamada Anna Bronsky tem a dura missão de preparar seu aluno, um adolescente introvertido, para a aprovação em um teste rigoroso de um conservatório musical. Ela tem ainda outras missões: cuidar de sua família (o marido francês e um filho na idade da bobeira) e da relação com um amante, igualmente músico e amigo de seu marido, que por sua vez é um luthier. O filho parece um pouco mais novo que o aluno problemático, e, também está aprendendo a tocar violino. Natural que se sinta enciumado do protegido de sua mãe. Mas, até que ponto vai esse ciúme? Nina Hoss, antiga atriz preferida de Christian Petzold, é a protagonista.
Hoss é mesmo a maior atração de um filme que se desenvolve na maior parte do tempo discretamente, sem muitos altos e baixos dramáticos. Contenção é o que um músico precisa ter na execução de certos números musicais. O filme adere a essa necessidade de contenção, tornando os momentos que rompem esse estado ainda mais dramáticos.
Ao direcionar suas energias para o aluno e o amante, Anna Bronsky acaba negligenciando marido e filho. É o que a sinopse diz, mas, sinceramente, não vejo muito isso, já que ela defendeu um aluno contra sua exclusão do conservatório e agora precisa fazer valer sua defesa na preparação para o exame. Em uma cena, o aluno pratica na casa da professora, e esta chama seu filho para um dueto. O filho não consegue, ou não quer acompanhar o aluno, mas é fato que Anna tentou integrá-lo em seu trabalho. Nesse momento específico, não houve negligência. Houve incompreensão de um menino mimado. Mas, uma coisa é sensível. A canalização para a música é tão forte que a vida de Anna está prestes a implodir.
A direção
A diretora Ina Weisse, com A Professora de Violino (2019), chega a seu segundo longa-metragem mais de uma década após o primeiro, Der Architekt (2008). Sua direção é precisa, sem grandes arroubos de estilo e com um senso de ritmo correto. É quase um feijão com arroz básico, temperado de modo a deixar os sabores harmonizados. Weisse é atriz, especialmente de telefilmes, ainda um ramo forte na Alemanha. Este segundo longa pode finalmente tornar sua carreira como diretora mais encaminhada.
Falando em comida, uma das cenas mais curiosas é quando Anna e seu amante esperam um frango ser assado. Eles conversam virados para o forno, versão miniatura daquilo que conhecemos como televisão de cachorro. Não vemos o frango sendo comido, mas fica a ideia de cumplicidade com o amante que ela nem sempre parece ter com o marido.
O olhar de Nina Hoss
A cena seguinte mostra justamente uma discussão entre Anna e o marido, porque, segundo ele, Anna exige demais de Jonas. Não basta o filho ser também violinista. Ele precisa ser bom. Não foi o que vimos, exatamente, o que indica uma percepção ligeiramente equivocada do marido ou uma omissão da diretora de algumas características da professora no trato com seu próprio filho.
Anna não chega a ser como o professor vivido por J.K. Simmons em Whiplash (Damien Chazelle, 2014), um tirano que suga a energia de seus alunos e raramente consegue o que quer deles, a excelência. Mesmo assim, e mesmo num país tido como do rigor e da precisão, a Alemanha, Anna é vista como exagerada, rigorosa demais, até consigo mesma. É certo que num momento de explosão e diante de um aluno travado, ela chega a perder a calma, e com isso também a capacidade de ensinar. Mas, é um momento visto num todo em que ela se dedica bravamente ao ensino, sem ter respaldo do marido, o compreensivo de almanaque.
Com pequenos dramas, intolerâncias e silêncios incompreendidos, o filme vai caminhando, até que os dramas se tornem mais intensos, exigindo também maior tato na direção, algo que Weisse demonstra apenas parcialmente. A saída da protagonista de seu eixo, contudo, não significa que o filme perca também seu eixo. Pelo contrário: a cena final é um de seus pontos altos, graças ao olhar de Nina Hoss e à sensibilidade da diretora.
Texto escrito pelo crítico e professor de cinema Sérgio Alpendre, especialmente para o Leitura Fílmica.
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Ficha técnica:
A Professora de Violino | Das Vorspiel | 2019 | Direção: Ina Weisse | Roteiro: Daphne Charizani, Ina Weisse | Elenco: Nina Hoss, Simon Abkarian, Serafin Mishiev, Ilja Monti, Jens Albinus, Sophie Rois, Thorsten Merten, Franziska Fauth, Thomas Thieme, Serafin Mishiev, Winnie Böwe, Alexander Hörbe.
Distribuição: Filmicca.