Em A Última Loucura de Claire Darling aborda a terceira idade. Com isso, a diretora francesa Julie Bertuccelli transmite ao público a tristeza que sente a protagonista de seu filme, Claire Darling, durante o que acredita ser esse seu último dia de vida.
O filme é uma adaptação do livro “Faith Bass Darling’s Last Garage Sale”, de Lynda Rutledge. Porém, transposto para uma pequena cidade na França, onde vive Claire, interpretada por Catherine Deneuve, uma senhora que vive reclusa e sozinha em sua grande casa. Ela acorda com a certeza de que morrerá à noite, portanto, resolve colocar todos os seus móveis e objetos à venda. Muitos deles são antiguidades valiosas, mas Claire os oferece por valores simbólicos. É uma forma de expurgar as lembranças tristes que esses itens trazem para ela. Aliás, trata-se de uma melancolia também sentida, mas não compartilhada, com a filha Marie (Chiara Mastroinanni), a quem não vê há vinte anos.
Então, uma antiquária amiga de Marie percebe que Claire já não está lúcida e resolve chamar Marie, que retorna à cidade onde nasceu e revê a mãe e um antigo amigo. Nesse dia, mãe e filha encararão o sofrimento que as atormenta por tanto tempo.
Catherine Deneuve
Catherine Deneuve, aos 75 anos, continua ativa em sua carreira e aqui contracena com sua filha na vida real, Chiara Mastroianni, fruto do relacionamento que teve com o também famoso ator Marcelo Mastroianni. Essa escolha de elenco aumenta a carga emocional deste drama sobre vidas desperdiçadas depois de uma tragédia.
Aos poucos, o filme revela o que aconteceu para gerar tanta tristeza sobre essa família rica. É um sentimento tão forte que arruinou no desprezo pelos bens materiais. Por isso, Claire nunca se lembrou de recolher o dinheiro que o marido escondia dentro dos livros da casa. Por sinal, Marie não se importa que a mãe se desfaz de tudo por uma ninharia.
Direção de Julie Bertucccelli
Julie Bertuccelli dirige com ousadia este seu terceiro longa-metragem de ficção. Primeiro, transmite a perda de lucidez de Claire através de planos subjetivos que mostram o que ela vê em contraponto com a realidade, o que até é comum na cinematografia clássica. Porém, quando simboliza isso na cena em que Claire dirige sozinha um carrinho de bate-bate em um parque de diversões, a diretora pede ao espectador que reflita. Em outras palavras, que conecte essa cena imaginária com o fato de a protagonista viver isolada no mundo, porque sua mente falha não a permite se relacionar com as pessoas.
Aliás, Claire conduz sua vida como nesse brinquedo, ou seja, como se ninguém pudesse interferir em seu trajeto. Igualmente, os flashbacks também aparecem com um fator que foge do tradicional. Nesse sentido, o personagem que acessa essa memória aparece na tela, sem interagir com o passado, mas, observando a ele mesmo naquela situação.
Contudo, em algumas sequências, Julie Bertuccelli confunde o espectador, aparentemente sem intenção. Por exemplo, na abertura do filme, vemos uma menina se deitando na cama e o plano seguinte mostra Claire, já envelhecida, acordando. Com isso, temos a impressão que a menina era Claire, mas na verdade descobriremos posteriormente que ela é Marie. Então, isso não faz muito sentido na narrativa e acaba atrapalhando a primeira parte de A Última Loucura de Claire Darling
Definitivamente, o filme ganha um interesse maior a partir da chegada da filha Marie à cidade. Afinal, o público dificilmente se identifica com Claire, pois nem ela mesmo consegue compreender seu estado mentalmente debilitado. Na verdade, é Marie quem consegue capturar a empatia do espectador.
Final desconcertante
O filme tem um final desconcertante, totalmente imprevisto. Mas que, como a alegoria da cena com Claire no parque de diversões, pode não ter acontecido de fato, e apenas simbolizar o derradeiro momento da protagonista. Em qualquer caso, é um belo momento em que as imagens dos objetos, que vimos durante o filme e sabemos o que representam para os personagens, surgem em câmera lenta arremessados para o alto por uma grande explosão. E isso com duração suficiente para provocar a reflexão do espectador. Aliás, a sequência lembra muito, e deve ser uma referência, à cena final de Zabriskie Point, de Michelangelo Antonioni, que contava com uma apropriada trilha do Pink Floyd.
Em suma, A Última Loucura de Claire Darling é um drama muito triste, mas sem ser provocador de lágrimas. Julie Bertuccelli arrisca um pouco de ousadia, o que pode afastar o público mais tradicional. Porém, isso dá um interesse especial para quem está aberto a um pouco de experimentação.
Ficha técnica:
A Última Loucura de Claire Darling (La dernière folie de Claire Darling, 2018) França. 94 min. Dir: Julie Bertuccelli. Rot: Julie Bertuccelli, Sophie Fillières. Elenco: Catherine Deneuve, Chiara Mastroianni, Samir Guesmi, Alice Taglioni, Laure Calamy, Olivier Rabourdin, Johan Leysen.
A2 Filmes
Trailer:
Leia entrevista com a diretora Julie Bertuccelli aqui.