Acredite em Mim: A História de Lisa McVey entrega o que se espera de um filme feito para a TV. Seu grande trunfo é o incrível acontecimento real que deu origem ao roteiro. Em 1984, na cidade de Tampa, na Flórida, uma garota raptada consegue sobreviver e se torna elemento chave para desvendar uma onda de assassinatos em série.
O título do filme, assim com sua sinopse, dá a falsa impressão de que a trama gira em torno da tentativa da vítima de convencer que realmente foi sequestrada. Para quem quer encontrar esse tipo de história, recomendamos a minissérie Inacreditável (Unbelievable, 2019), com Kaitlyn Dever e Toni Collette, disponível na Netflix. Afinal, Acredite em Mim: A História de Lisa McVey só toca nesse ponto durante alguns minutos logo após Lisa McVey sair do cativeiro e procurar a polícia. Sua família desajustada induz a polícia a desacreditá-la. Isso porque a sua avó, com quem ela vive, teme que ela revele que o namorado da avó abusa sexualmente da menina. Assim, os primeiros interrogatórios são tendenciosos. Mas, o experiente Sargento Larry Pinkerton acredita nela e ainda descobre nos seus relatos evidências que conectam com o serial killer que vem aterrorizando a região há meses.
O diretor do filme, o veterano Jim Donovan, conduz com obviedade o roteiro. Tanto que, na primeira vez que o Sargento Pinkerton entra em cena, já sentimos que ele será o policial bonzinho que ajudará a protagonista. Antes disso, é igualmente fácil prever que a garota que sai do trabalho numa doceria às duas da manhã, andando de bicicleta pelas ruas vazias, logo será atacada. Então, o filme relata o cativeiro durante uns vinte minutos, às vezes deixando transparecer alguma sensualidade que não deveria existir nesse momento horrendo.
Uma heroína inesperada
Acima de tudo, o mais interessante do enredo é a própria personagem da vítima. Ela tem uma família disfuncional, a mãe não a quer em casa e a deixa na casa da avó. E lá, tem que se submeter aos abusos sexuais do namorado da avó, sob conivência de todos. Mas, essa dura realidade a prepara para enfrentar com astúcia o rapto, como o próprio sargento afirma em momento posterior.
Lisa McVey percebe que, ao chorar como uma vítima indefesa, o agressor se sente mais excitado. Então, ela finge ser compreensiva e bondosa, sem refutar a aproximação do estuprador misógino. Com isso, ele acaba desistindo dela e a liberta, apesar de que, numa “licença poética” do roteirista, vemos o criminoso sozinho no carro se arrependendo e tentando reencontrá-la. Acima de tudo, o que surpreende os policiais é a atenção aos detalhes que a vítima conseguiu memorizar e que os ajuda na investigação. Além disso, Lisa espalha evidências de sua presença no cativeiro e no carro desse homem, que serão cruciais para incriminá-lo.
Produção televisiva
A história é bombástica, mas a produção a retrata como um episódio da série procedural Law & Order: Special Victims Unit, dedicada a crimes sexuais. Destinado à televisão, Acredite em Mim: A História de Lisa McVey evidencia que foi filmado a toque de caixa, sem uma dedicação maior que poderia render um filme mais poderosos.
Algumas de suas falhas são gritantes. Por exemplo, logo no início, quando Lisa sai de sua casa após falar ao telefone com a mãe, o namorado da avó está lá fora e a ameaça. Porém, ele estava lá dentro na cozinha segundos antes. Provavelmente, não são cenas subsequentes, mas a montagem confusa faz parecer que são. Em outro momento, causa estranheza que a polícia conte para a irmã caçula, uma adolescente mais nova que Lisa, sobre o rapto e estupro desta. Além disso, o filme usa dois jump scares desnecessários, um deles pregando susto com um esguicho de água automático no jardim. Da mesma forma, emprega duas sequências de pesadelo totalmente gratuitas e previsíveis.
Porém, um dos pontos mais significativos está no mau uso da presença física da atriz Katie Douglas. Jovem e pequena, com apenas 1,52m de altura, ela aparenta uma criança quando veste jeans e camisa, na parte do filme que acompanha as investigações. Antes, essa jovialidade poderia estar mais ou tão evidente durante o rapto e o estupro, o que daria ao filme uma força dramática mais chocante.
Triunfante
Por outro lado, podemos elogiar pelo menos uma cena. Está muito bem construído o momento em que, já perto do final, Lisa McVey se olha no espelho e se lembra quando estava no banheiro do cativeiro. E, sem precisar dizer nada, sentimos seu merecido ar de triunfo, quando ela levanta ligeiramente a cabeça. Afinal, ela não só sobreviveu ao serial killer, mas também se livrou da família que lhe fazia mal. A presença da verdadeira Lisa McVey fecha essa história empoderadora de uma heroína do dia a dia.
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Ficha técnica:
Acredite em Mim: A História de Lisa McVey | Believe Me: The Abduction of Lisa McVey | 2018 | 87 min | Canadá | Direção: Jim Donovan | Roteiro: Christina Welsh | Elenco: Katie Douglas, David James Elliott, Rossif Sutherland, Amanda Arcuri, Chris Owens, Bruno Verdoni, Shelby Bain, Milton Barnes, Alexandra Castillo, Patrice Goodman, Kim Horsman.
