Noites Brutais (Barbarian) é a obra de superação do cineasta Zach Cregger após uma perda trágica.
É raro, mas alguns filmes de terror B, de baixo orçamento, conseguem surpreender. Um exemplo clássico é o assustador Uma Noite Alucinante: A Morte do Demônio (The Evil Dead, 1981), de Sam Raimi. Este Noites Brutais (Barbarian), de Zach Cregger, causa impacto similar. O tempo dirá se a comparação é exagerada, e se Cregger alcançará o nível de Raimi (que viria a dirigir a trilogia do Homem-Aranha estrelada por Tobey Maguire). É o primeiro longa que Cregger dirige sozinho, pois ele já realizara dois em conjunto com o comediante Trevor Moore, com quem fundara a trupe Whitest Kids U’ Know. Moore morreu tragicamente em 2021, em um acidente em casa.
Detroit em ruínas
Em Noites Brutais, o diretor Zach Cregger, também autor do roteiro, reiteradamente quebra as expectativas do espectador. O trunfo não está só no script, mas também em como ele dirige. Nesse sentido, consegue provocar a planejada surpresa sobre a deterioração do bairro em Detroit onde se localiza a bonita casinha branca que Tess (Georgina Campbell) aluga pelo Airbnb. Para isso, simplesmente utiliza técnicas básicas como o uso do plano fechado e do plano aberto.
Nessa primeira parte do filme, o filme envolve com um suspense em uma situação cotidiana, ao qual todos estamos sujeitos. Ou seja, Tess descobre que já tem outro inquilino na casa, que também fez reserva via aplicativo. Esse personagem, Keith, é interpretado por Bill Skarsgård, que consegue transmitir uma aparência dúbia. Assim, sob a perspectiva de Tess, ela passa essa noite com um inesperado colega de quarto, sob uma forte desconfiança. Nós, espectadores, acompanhamos sua suspeição e acreditamos que embarcaremos numa trama sobre serial killer ou algum outro crime concreto. Nessa primeira parte, merece destaque o plano que filma a xícara de chá que Keith prepara para Tess, comunicando, assim, o receio dela de essa bebida conter algum entorpecente. Logo, o terror aumentará exponencialmente e uma figura horripilante encerrará essa parte.
O mal escondido
A seguir, parece que estamos em outro filme. Vemos um novo personagem, AJ (Justin Long), dirigindo feliz pela Pacific Highway Coast, perto de Malibu. Assistimos ao seu drama pessoal, que só não fica aborrecido porque permanecemos curiosos a respeito do rumo que o filme tomará dali em diante. Enfim, ele acaba na mesma casa que Tess alugou, e ele logo enfrenta o terror que está lá dentro, agora mais explícito. Mas, o filme ainda reserva outras mudanças de tom e surpresas na trama.
O flashback é outro momento inventivo e que quebra as expectativas. Estamos no mesmo bairro, mas no período antes da crise, na época em que Ronald Reagan era o presidente (segundo a notícia no rádio). Todas as casas estão coloridas, o jardim bem cuidado, até exageradamente. Lembra até o cenário que abre o icônico Veludo Azul (Blue Velvet, 1986), de David Lynch – com similar mensagem, a do mal escondido num local superficialmente bonito. O uso de lentes que distorcem a imagem ajudam a apresentar o personagem esquisitão dessa sequência, que revela a origem das criaturas que aterrorizam a casa no presente.
Por fim, a parte final reserva os momentos de gore, na dose certa para o tom que o filme construiu de forma não-linear. Aliás, vale destacar: sem recorrer aos jump scares. Em relação aos personagens, a conclusão abre espaço para condenar o homem acusado de estupro, que no momento do desespero revela quem realmente é. Além disso, escancara a inépcia da polícia, e a bravura da protagonista feminina.
Noites Brutais (Barbarian), dessa forma, surpreende. O diretor e roteirista Zach Cregger inova, mesmo sendo este um filme de gênero, e ainda dá uma volta por cima em sua carreira. Se reinventa e supera a perda do seu amigo e parceiro criativo.
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Ficha técnica:
Noites Brutais | Barbarian | 2022 | EUA | 102 min | Direção e roteiro: Zach Cregger | Elenco: Georgina Campbell, Bill Skarsgård, Justin Long, Matthew Patrick Davis, Richard Brake, Kurt Braunohler, Jaymes Butler, Sophie Sörensen.
Distribuição: Star+.