A narrativa paralela de Bird Box sustenta o suspense dessa nova opção de distopia.
Desta vez, para escapar do mal, você não pode vê-lo. Então, é quase que automático relacionar Bird Box a Um Lugar Silencioso (A Quiet Place), filme do mesmo gênero lançado também em 2018 cuja história prega que a solução para a salvação é o silêncio. É curioso como os dois filmes possuem várias semelhanças. Apenas variam, essencialmente, na escolha de qual dos sentidos trama explora. Mas o impacto do longa com Emily Blunt é mais poderoso. Inclusive porque chegou aos cinemas, enquanto o com Sandra Bullock está disponibilizado via streaming pela Netflix. Mas vale a pena ver os dois.
A trama
Em Bird Box (“caixa de pássaro”), as pessoas entram em depressão profunda e se suicidam após olharem para estranhas criaturas que surgem em todos os lugares do mundo. Malorie (Sandra Bullock), grávida, e um pequeno grupo se salvam. Eles se refugiam dentro de uma casa onde todas as janelas estão vedadas para que ninguém veja esses seres misteriosos lá fora. Em paralelo, acompanhamos a mesma personagem, cinco anos depois, com duas crianças. Todos descem um rio em um bote, com os olhos vendados, para encontrar outros sobreviventes.
Ao quebrar em duas linhas a narrativa, uma no presente e outra cinco anos antes, o roteirista Eric Heisserer garante o interesse pela estória, porque o espectador pode gradativamente montar as peças que revelam como se chegou nessa situação atual. Aos poucos, as sequências do passado explicam o motivo das vendas usada pelos personagens, quem são essas crianças, quem é o homem sem vendas nos olhos que eles encontram durante o trajeto, para onde vão, como chegaram ali, etc.
Recursos audiovisuais
Usa-se muito a câmera subjetiva com a visão obstruída pelas vendas para que o espectador possa vivenciar a sensação angustiante dos personagens. O efeito não é tão impactante como poderia ser se insistisse em manter esse plano subjetivo durante planos mais longos, ao mesmo tempo usando a edição de som para causar o suspense em não se saber quem ou o que está ao redor.
Algumas cenas provocam muita tensão. A melhor delas mostra a morte da irmã de Malorie, uma das primeiras de algum personagem da estória, revelando a tristeza desesperada que a criatura provoca em quem a vê. Sarah Paulson expressa toda essa agonia dirigindo um veículo, enquanto a personagem de Sandra Bullock está no banco de passageiro sem perceber a princípio o que está acontecendo, para se afligir quando tenta impedir a irmã de cometer uma loucura.
Tal como Sofia
A atriz Sandra Bullock se esforça em reviver a atuação de Meryl Streep em A Escolha de Sofia (Sophie’s Choice, 1982). Malorie, assim como Sofia, precisa escolher qual das crianças deve morrer. A cena em que Malorie supostamente precisa decidir quem se arriscará a abrir os olhos para guiar a direção do bote se resolve rápido demais. Na verdade, funcionaria muito melhor se Bullock demorasse mais para se decidir.
O filme acerta em não mostrar o ser misterioso que provoca todo esse extermínio, permitindo que o espectador imagine como seria sua aparência. O que se vê na tela são apenas suas sombras, ventos que levantam folhas e dobram a mata, e desenhos realizados por um dos loucos que podem vê-lo sem se destruírem. Assim, ao negar ao espectador a visão do mal, o filme preserva a consistência da estória e coloca o público na mesma situação dos personagens principais. Com isso, se afasta de se classificar dentro do gênero terror, apesar de apresentar alguns litros de sangue em determinadas mortes.
A solução final é convincente, apesar de longe de ser genial e, para muitos, previsível. Afinal, quem seriam as pessoas que, além dos loucos, não sofreriam com esse mal que destrói quem o vê? Não é uma pergunta muito difícil de se responder.
Por fim, o livro de autoria de Josh Malerman, que deu origem ao filme, foi publicado em 2014, bem antes de Um Lugar Silencioso, e seu roteiro já estava pronto na época. Portanto, evite o exercício de compará-lo a Um Lugar Silencioso e aprecie o instigante suspense vindo da inteligente construção narrativa de Bird Box.
Ficha técnica:
Bird Box (Bird Box, 2018) EUA, 124 min. Dir: Susanne Bier. Rot: Eric Heisserer. Elenco: Sandra Bulock, Trevante Rhodes, John Malkovich, Sarah Paulson, Jacki Weaver, Rosa Salazar, Danielle Macdonald, Lil Rel Howery, Tom Hollander, Machine Gun Kelly, BD Wong, Pruitt Taylor Vince, Vivien Lyra Blair, Julian Edwards, Parminder Nagra.
Assista ao filme online na Netflix