O filme conta o período da vida de casada da escritora francesa Sidonie-Gabrielle Colette. Sua obra inclui o livro “Gigi”, publicado em 1944 e que ganhou versão cinematográfica catorze anos depois pelas mãos do diretor Vincente Minnelli. Aqui, essa figura polêmica chega às telas na pele de Keira Knightley, que parece não ter sido a melhor escolha para o papel, apesar de todo seu talento.
Keira Knightley
O diretor inglês Wash Westmoreland, em seu filme anterior, Para Sempre Alice (Still Alice, 2014), extraiu uma performance magistral de Julianne Moore, que deu à atriz o Oscar de Melhor Atriz. Claramente, ao decidir por realizar Colette, contando com a talentosa Keira Knightley como protagonista, similar expectativa foi criada. De fato, Knightley, valendo-se de sua natural fineza, combina perfeitamente com os filmes de época, como este. E, de fato, a atriz transmite classe mesmo que o berço da personagem seja uma pequena cidade no interior da França. Adicionalmente, isso faz com que se sinta deslocada nas primeiras festas que frequenta em Paris com Willy, seu marido catorze anos mais velho. Com o tempo, sua personagem Colette assumirá o foco das atenções nos eventos sociais.
A história de Colette
Assim, na França, no final do século 19, Colette parte de sua pequena cidade Saint-Sauveur-en-Puisaye para Paris quando se casa com Willy. Ele é um produtor literário que publica textos em jornais escritos por autores fantasmas por ele contratados. Quando estes ameaçam parar de trabalhar por falta de pagamento, ele pede que Colette comece a escrever. Então, encontra em seus rascunhos um talento literário natural que ele ajuda a lapidar. Até publicar um romance em 1900 baseado nas memórias dela, com o título de “Claudine na Escola”, que se torna um sucesso de vendas.
Mas, à medida que mais três livros sobre Claudine, alter-ego de Colette, são publicados até 1903, cresce o auto reconhecimento dela sobre seu próprio talento. Com isso, surge o inevitável confronto com Willy em busca de créditos pela autoria das obras. Em paralelo, Colette descobre sua atração por mulheres, e é incentivada por Willy a satisfazer seus desejos. O filme se encerra junto com o casamento de Willy e Colette, antes que ela solidifique sua carreira como escritora.
E, em parceria com sua amante Missy, a Marquesa de Belbeuf (Denise Gough), Colette se apresenta em teatros de vaudeville, em números ousados, com conotações homossexuais. Aliás, a apresentação ambientada no Egito representa um dos melhores momentos de atuação de Keira Knightley no filme, quando ela dança com um magnetismo irresistível. A coreografia de Colette se fundamenta na pantomima, arte que a encanta desde que ela assiste pela primeira vez a atuação de Wague (Dickie Beau), em uma festa, ao dublar uma cantora lírica. É sintomático que essa preferência se relacione com a situação de Colette como escritora fantasma para Willy. Colette, nesse sentido, ocupa a mesma posição da cantora, que produz a voz para o mímico, que é o artista que ocupa a posição de destaque.
O tom do filme
Há pelo menos uma sequência de humor no filme, uma montagem que brinca com as visitas alternadas de Colette e Willy à jovem Jeanne de Caillavet (Janine Harouni), que se tornou amante dos dois. Predomina, contudo, o drama ameno, que não investe no lado mais triste da situação de Colette, o que não combinaria com a sua personalidade altiva, incapaz de sofrer passivamente. Apesar de acertar nesse ponto, o filme cria um vale no meio de sua narrativa, por onde se perde o interesse pela história. Isso acontece pela carência de sensualidade, característica marcante de Colette, a partir da descoberta de sua atração pelas mulheres.
Em outras palavras, Wash Westmoreland, o diretor, conseguiu de Keira Knightley uma excelente atuação nas cenas dramáticas e nas danças. Porém, não a representação da excitação da personagem nas cenas de sexo, seja com Willy ou com as amantes. A falta deste ingrediente esvazia o filme.
A belíssima direção de arte reconstitui a época em que a história transcorre. Dessa forma, compõe o ambiente sofisticado em que viviam Willy e Colette. E isso apesar da constante falta de dinheiro do casal, resultado da gastança inconsequente do marido. Por outro lado, o tema principal da trilha sonora, tocado no piano, transmite uma tristeza quase trágica que não encontramos no filme. E, muito menos, na personagem.
Colette, por isso, apesar das qualidades destacadas, parece uma criação sem unicidade. E falha em espelhar o espírito da pessoa retratada no filme. Com certeza, Sidonie-Gabrielle Colette era mais interessante que essa sua cinebiografia.
Ficha técnica:
Colette (Colette, 2018) EUA/Reino Unido. 111 min. Dir: Wash Westmoreland. Rot: Richard Glatzer & Wash Westmoreland & Rebecca Lenkiewicz. Elenco: Keira Knightley, Dominic West, Eleanor Tomlinson, Fiona Shaw, Ray Panthaki, Aiysha Hart, Denise Gough, Janine Harouni, Robert Pugh, Caroline Boulton, Masayoshi Haneda, Shannon Tarbet.