A computação gráfica democratiza as produções de gêneros que dependem de efeitos especiais e visuais, como a ficção-científica. É o caso de Contos do Amanhã (2020), longa de estreia do diretor Pedro de Lima Marques rodado em Porto Alegre (RS) que seria inviável sem a CG. Afinal, seu enredo demanda a construção de cidades do ano de 2165, fortalezas gigantescas erguidas para a sobrevivência de seus moradores num futuro distópico ameaçado pela escassez de comida.
A trama principal se desenrola no ano de 1999, pois a existência daquelas cidades futurísticas depende de uma chave do passado. Como em O Exterminador do Futuro (The Terminator, 1984), agentes do futuro viajam no tempo para proteger esse elemento, que corresponde ao jovem Jeferson (Bruno Barcelos). Ele é forçado a entregar o poder que desconhece que possui, quando sequestram sua melhor amiga Bia (Duda Andreazza).
Os aspectos materiais da direção de arte (elementos de cena, figurinos etc.) e de finalização (tom das cores), enfatizam a época do final dos anos 1990, às vésperas do bug do milênio. Este, inclusive, é citado no filme – mas não tem relação com a história. Faltou apenas músicas grunge para caracterizar a preferência do protagonista, aficionado pelo rock da época, como demonstram suas camisetas e os posters em seu quarto. Mas, a ausência se justifica pelos direitos autorais que encareceriam a produção. Enfim, essa ambientação serve como atrativo adicional ao público que sente nostalgia desse momento.
A trama
Quanto ao enredo em si, ele deve agradar aos fãs de ficção-científica que apreciam histórias com fundamento na tecnologia, como “Ghost in the Shell” (o mangá de Masamune Shirow) e Matrix (The Matrix, 1999), filme de Lana e Lilly Wachowski. O personagem principal se conecta com hackers e baixa arquivos que são na verdade mensagens do futuro. Nesse sentido, Contos do Amanhã não foge à regra desse subgênero em relação à complexidade da trama, que o filme tenta explicar durante os diálogos.
Por outro lado, a conclusão deixa as portas abertas para uma metáfora menos científica e mais emocional. O sequestro acontece na despedida de Jeferson e Bia, após passarem um agradável dia juntos. E, o desfecho revisita essa cena e interrompe esse destino trágico quando o rapaz declara o amor que sente pela garota. Dessa forma, Contos do Amanhã se aproxima dos filmes românticos sobre personagens que desperdiçaram a oportunidade de ficar com o amor de sua vida.
A edição clássica do filme garante a sua fluidez. Porém, quando ocorre o sequestro, há uma ausência incômoda da personagem Bia, que até então era uma das protagonistas da história. A trama se afasta totalmente de sua perspectiva e ela ressurge como mero acessório no confrontamento final do herói com o vilão. Por fim, a conclusão se redime dessa falha e a coloca de volta ao protagonismo, mas isso não apaga o incômodo de sua ausência, justamente quando o ritmo do filme se torna mais lento.
Em suma, Contos do Amanhã é uma ficção científica brasileira digna do gênero, apesar da fragilidade de sua história. Pelo menos, é bem dirigida, dentro dos padrões clássicos, e traz atuações acima da média dos jovens estreantes Bruno Barcelos e Duda Andreazza.
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Ficha técnica:
Contos do Amanhã | 2020 | Brasil | 85 min | Direção e roteiro: Pedro de Lima Marques | Elenco: Bruno Barcelos, Duda Andreazza, Anderson Vieira, Fernanda Roggia, Bruno Krieger, Simone Telecchi, Catharina Conte, Cláudia Barbot, Daiane Oliveira, Douglas Carvalho, Edson Carteri e Marcelo Herrera.
Distribuição: Europa Filmes, em colaboração com Araçá Filmes e Cavideo.
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