Corra! foi produzido pela Blumhouse, de Jason Blum, produtora especializada em filmes pequenos de terror que estourou com Atividade Paranormal (2007). O segredo do sucesso de alguns de seus filmes é: uma boa ideia, filmada com poucos recursos, que cresce no marketing boca a boca.
A trama
É isso que Corra! conseguiu. O argumento bem original traz o jovem negro Chris (Daniel Kaluuya) em sua primeira visita à casa dos pais de sua namorada branca, Rose Armitage (Allison Williams), no interior dos EUA. Lá, apesar da aparente cordialidade, ele nota algo estranho nos empregados da casa, os também negros Georgina e Walter. Na primeira noite, ele acaba sendo disfarçadamente hipnotizado por Missy, a mãe de Rose. Ela o conduz a um chamado “sunken place”, onde ele se afunda e não consegue se mexer, enquanto revela seu trauma de infância, o de se sentir culpado pela morte da mãe.
No dia seguinte, acontece uma grande reunião de amigos na casa dos pais de Rose. O filme coloca o espectador como cúmplice dos estranhos olhares dos convidados sobre Chris. Então, chega um convidado negro e jovem como ele. Porem, ele age estranhamente, e Chris suspeita que ele está sob algum transe hipnótico manipulado por Missy. No entanto, a trama revelará suspeitas muito mais bisonhas.
Terror psicológico
Não há sobrenatural no terror de Corra!, e essa é uma vantagem para engajar o espectador. O mistério gira em torno de algo que realmente pode acontecer, independente da crença religiosa de cada um. Afinal, desvios psicóticos às vezes se escondem nas melhores famílias, e esse parece ser o caso dos Armitage. Afinal, logo de cara, fica evidente que o irmão de Rose é tão agressivo como o Alex de Malcolm McDowell em Laranja Mecânica (1971).
Apesar do sucesso comercial obtido por Corra!, seu roteiro poderia ser melhor. A resolução dos mistérios acontece rápida demais, deixando escapar oportunidades de manter o suspense por mais tempo. Nesse sentido, a personagem da criada Georgina mereceria maior exploração. Betty Gabriel, a atriz que a interpreta, construiu uma expressão facial e corporal tão assustadora que toda cena em que ela está se torna arrepiante.
Por outro lado, o roteiro critica o preconceito racial como o motivo de os negros serem escolhidos como vítimas. Trata-se de um tema relevante levantado pelo seu realizador, Jordan Peele, que ecoou muito bem dentro da comunidade negra nos EUA. Em tempos de governo de extrema direita, esse apelo soa ainda mais forte.
Contudo, o roteiro merece questionamento a respeito de quão relevante foi ter exposto aos espectadores o trauma que Chris carrega pela morte da mãe. Afinal, isso não afeta em nada a narrativa. Assim, soa uma solução apelativa para inserir a ideia do “sunken place”.
Sucesso
Corra! deve seu sucesso principalmente ao ritmo ágil, que não perde tempo com tolices, exceto essa do trauma do protagonista. Acelera um pouco demais na resolução dos mistérios, mas, mesmo assim, flui bem. E tem ainda o apelo de ser uma estória possível de acontecer e de levantar a questão racial. Não provoca medo, salvo quando Georgina está na tela, mas possui bastante suspense.
Ficha técnica:
Corra! (Get Out, 2017) Japão/EUA, 104 min. Dir/Rot: Jordan Peele. Elenco: Daniel Kaluuya, Allison Williams, Catherine Keener, Bradley Whitford, Caleb Landry Jones, Marcus Henderson, Betty Gabriel, Lakeith Stanfield, Stephen Root, LiRel Howery, Ashley LeConte Campbell, John Wilmot, Caren L. Larkey, Julie Ann Doan, Rutherford Cravens.
Assista: entrevista com Jordan Peele sobre Corra!