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Quatro curtas de Wes Anderson na Netflix | Por Sérgio Alpendre

4 curtas de Wes Anderson
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Nos quatro últimos dias de setembro, a Netflix lançou os quatro últimos filmes de Wes Anderson, curtas-metragens baseados em contos de Roald Dahl (autor de A Fantástica Fábrica de Chocolate). É como se fosse um longa que tivesse seus episódios separados em curtas. A espinha dorsal é a mesma, embora a qualidade deles seja variável. Esses curtas mostram, após experimentos semelhantes de Pedro Almodóvar, que recentemente filmou dois curtas, um apetite recente pelo formato, que se mantém vivo também para autores consagrados.

A Incrível História de Henry Sugar

No dia 27 estreou o primeiro deles, A Incrível História de Henry Sugar (The Wonderful Story of Henry Sugar, 2023). O filme havia passado em 1 de setembro no Festival de Veneza. Está mais para um média, com seus 37 minutos de duração. Como a tendência atual é dividir os filmes entre curtas e longas, devemos considerá-lo um curta, ainda que com maior duração do que um curta habitual.

A questão é que com cinco minutos já tivemos um índice tão grande de Wes Anderson que seus detratores podem desistir antes que o filme diga a que veio. A rapidez das falas dos personagens, dirigidas muitas vezes ao público, o artificialismo ostensivo, a frontalidade, os cenários tipo dioramas (como o crítico David Ehrlich lembrou), os movimentos geométricos da câmera e as cores de mata-borrão dizem “presente” com alta intensidade. Não há filme mais paradigmático do cinema de Wes Anderson que esse.

Dev Patel interpreta o médico Dr. Chatterjee, que desenvolve uma técnica especial para o Henry Sugar do título, interpretado por Benedict Cumberbatch. O filme ainda traz Ben Kingsley e Ralph Fiennes, este interpretando o próprio Dahl e reaparecendo nas outras histórias (em O Caçador de Ratos, curiosamente, Fiennes também interpreta o personagem-título).

A velocidade com que esse médico narra sua experiência (praticamente tudo que Dahl escreveu no conto) faz com que o espectador tenha provavelmente muita dificuldade de entender tudo que se passa. É proposital. No cinema de Wes Anderson, não se entende tudo numa primeira visão. Seus filmes, goste-se ou não, pedem revisões. No fundo, o filme trabalha com uma construção em abismo na qual uma história está dentro de outra que também está dentro de outra. É uma fábula sobre a importância de contar histórias. Uma fábula a 200 km por hora.

O Cisne

O Cisne (The Swan, 2023) entrou na plataforma no dia 28. É talvez o mais infantil dos contos filmados, embora o estilo de Anderson desafie crianças que não sejam bem-dotadas, daquelas que costumam participar de programas de soletrar na TV. Um filme sobre bullying e adultos infantilizados. De todo modo, é provavelmente o mais frágil dos curtas.

O Caçador de Ratos

Após o mais fraco dos curtas, estreia, no dia 29, o melhor deles até então: O Caçador de Ratos (The Rat Catcher, 2023), uma fábula sobre ratos e homens, alcaçuz, feno e chocolate, uma pequena poesia com as cores habituais do diretor e um desenho de luz mais arrojado no clímax. Um Ralph Fiennes cabeludo está curioso como o caçador do título, cheio de ditados e ensinamentos para os demais personagens.

Veneno

A série Anderson-Dahl fecha em alto nível com Veneno (Poison, 2023), em que Harry, personagem de Benedict Cumberbatch, pensa haver uma pequena e venenosa cobra adormecida em sua barriga, embaixo de um livro que ele estava lendo. Dev Patel e Ben Kingsley são, respectivamente, o visitante que encontra Harry e o médico chamado pelo visitante. Patel continua falando diretamente para a câmera com uma velocidade absurda, como a de um locutor de rádio, mas desta vez não chega a cansar, talvez porque Veneno tem vinte minutos a menos que A Incrível História de Henry Sugar. Uma pequena pérola de tensão e humor, com um final anticlimático e irônico.

É de se estranhar que a Netflix ou Wes Anderson não tenham batalhado de algum modo para criar um longa com os quatro episódios. Tanto no estilo, uma espécie de super Anderson, quanto no tom, os curtas se completam. Após cada um deles, há um breve letreiro explicativo da situação que levou Dahl a escrever esses contos. Talvez o receio de fracasso devido ao recente cancelamento do escritor (por motivos bem justos, aliás), mas não de sua obra (ainda bem) possa ter pesado na decisão. Mas aí por que a ideia de o adaptar em primeiro lugar? Provocação pela metade.

Avaliações:
  • A Incrível História de Henry Sugar – 6,5
  • O Cisne – 5,5
  • O Caçador de Ratos – 7
  • Veneno – 7

Texto escrito pelo crítico e professor de cinema Sérgio Alpendre, especialmente para o Leitura Fílmica.

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