O documentário Democracia em Vertigem relata o recente cenário político pelo ponto de vista de um cidadão comum, sem posição partidária, dividida nesse turbilhão de reviravoltas no poder. Essa voz que atrai a empatia do espectador não é a de um locutor, é da própria diretora e roteirista, Petra Costa.
Petra começa a narrativa em 1984, quando tinha um ano. Ela conta que, nos anos 1970, seus pais viveram na clandestinidade em Londrina, após passarem alguns dias na prisão, por serem contra a ditadura. Eles vivenciaram o terror das perseguições políticas, viram pessoas próximas serem torturadas e mortas. Esse passado evidencia a relevância de seu filme, e se conecta com o seu epílogo, quando o presidente Jair Bolsonaro é eleito com discurso próximo à essa ditadura militar.
Resumo da história política do Brasil
Democracia em Vertigem exibe um resumo da história política do Brasil. Para isso, mostra imagens de arquivo e de acervo pessoal para tentar explicar como a ditadura foi substituída pela democracia. O futuro presidente Lula aparece em imagens antigas, em cima de um palanque, quando ainda era líder sindical. E, depois, em suas frustradas tentativas de se eleger, até, finalmente conseguir.
Apesar de Lula ser a figura mais destacada em Democracia em Vertigem, o filme não se posiciona cegamente ao seu lado. Na visão pessoal da diretora Petra Costa, o ex-presidente significou a esperança, quando foi eleito, e depois a decepção, quando vários esquemas corruptos vieram à tona nas investigações da Lava Jato. Ela seleciona algumas frases poéticas de discursos de Lula, mas fica desiludida por entender que, não importa qual presidente ou políticos estejam no poder, as oligarquias continuam se mantendo através de seus esquemas.
Democracia em Vertigem explica de forma clara esses esquemas onde os políticos são meras peças que os poderosos manipulam. Aliás, de forma mais didática do que aquele segmento da série ficcional O Mecanismo que faz uma alusão à propina do funcionário da concessionária de água e esgotos.
Prendendo a atenção
Petra Costa mantém a atenção do espectador, mesmo em um documentário político de duas horas de duração. Primeiro, por narrar o filme com suas visões pessoais, que não são a de um especialista, nem de um defensor de alguma posição ideológica. Mas, de uma pessoa comum que, como a maioria dos brasileiros, se sentiu perdida diante do turbilhão de acontecimentos. O espectador, assim, acompanha o processo de revisitar as imagens desse passado recente para analisá-las e assim extrair um entendimento mais apropriado, fora do calor do momento.
E, também, por se inserir no contexto da história que ela relata, encontrando pontos de contato com sua trajetória pessoal. Afinal, Petra Costa consegue se infiltrar como testemunha ocular desses momentos importantes. Dessa forma, reúne sua mãe e a ex-presidente Dilma Roussef, ou filmar Lula passando ordens pelo celular em um quarto de hotel. Tal qual uma Forrest Gump.
Enfim, Democracia em Vertigem deixa o gosto amargo da descrença. De fato, capta o povo discutindo nas ruas, individualmente ou em manifestações, digladiando em defesa de suas posições, mas tudo isso parece ser em vão. No fim, as oligarquias sempre permanecem dirigindo o Brasil, não importa que partido político esteja no poder, não importa se na democracia ou no autoritarismo.
Por isso, Democracia em Vertigem não agradará os radicais que querem ver na tela uma defesa dos seus ideais. Na verdade, é um ótimo material para uma reflexão isenta, que vai além da polarização partidária.
Ficha técnica:
Democracia em Vertigem (2019) Brasil. 121 min. Dir/Rot: Petra Costa. Com: Dilma Rousseff, Luiz Inácio Lula da Silva, Marisa Letícia Lula da Silva, Sergio Moro, Nestor Cerveró.
Trailer de Democracia em Vertigem: