Mesclando documentário e ficção, e ainda com toques experimentais, Eami é o terceiro longa-metragem da cineasta Paz Encina.
O filme se passa no Chaco, em sua porção paraguaia. Conta, na língua Ayoreo, a saga de Asoja, uma mulher-deusa-pássaro que transmuta seu espírito. Viveu como tigre, planta, onça e agora como uma menina, Eami. Em constante processo de cura da dor, Eami sofre a expulsão de suas terras por força dos “coñones”, as pessoas da civilização.
Retrato impressionista
Com abordagem impressionista, Encina fixa sua câmera enquanto coloca a narração em off. Seja numa imagem simbólica, como os ovos no leito do rio que abrem o longa, ou num close nos rostos dos personagens com os olhos fechados. Acima de tudo, o filme se concentra na provocação de sensações, já que as palavras evocam metáforas que compõem a história mística de Asoja. Ainda assim, algumas frases claramente descrevem o sofrimento do povo indígena obrigado a sair de seu território. “Até quando preciso curar as dores?”, indaga com desilusão a menina Eami. Quando a imagem mostra coñones armados com rifles subjugando uma família indígena, fica mais que explícito o propósito do filme.
Os planos-detalhes, muito empregados aqui, enfatizam o que mais a diretora quer que impacte. Nesse processo, os sons possuem papel fundamental na narrativa, por vezes significando mais do que a imagem que está na tela. Por exemplo, na cena em que ouvimos um ataque real contra os índios, enquanto vemos uma mesa com prato e talheres. Aliás, a imagem fica propositalmente numa posição acessória, como no trecho em que as crianças nadam na lagoa e a câmera filma a água se mexendo para só depois focar nelas. Mas a união de som e imagem ganha espaço para revelar a força da natureza. Em especial, quando o vento forte balança as árvores – numa mise-en-scène que lembra o cinema de Apichatpong Weerasethakul, outro diretor que gosta de filmar a selva.
Tristeza e esperança
Mas Eami é um retrato impressionista triste. Através das essências, coloca-nos na pele da menina, e de todos os indígenas que sofrem o mesmo suplício. Amargamos, assim, a saudade pelas pessoas amadas que morreram, o presente de fugas e curas sem fim, e a incerteza sobre o futuro. No entanto, o abrir dos olhos nos últimos quadros indicam um despertar esperançoso.
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Ficha técnica:
Eami | 2022 | 85 min. | Paraguai, França, Argentina, México, Países Baixos, Alemanha | Direção e roteiro: Paz Encina | Elenco: Anel Picanerai, Curia Chiquejno Etacoro, Ducubaide Chiquenoi, Basui Picanerai Etacore, Lucas Etacori, Guesa Picanerai, Lazaro Dosapei Cutamijo, Catebia Picanere Chiqueño, Jonatan Chiqueño Etacore, Hernán Bego Dosapei Cutamijo.
Distribuição: Filmicca.
O filme Eami estreia nos cinemas no dia 17 de agosto, com duas sessões com debate:
- em São Paulo, no Cine Satyros Bijou, nesta sexta-feira, 18/08, às 20h. Após a sessão, uma conversa com a professora e historiadora Yanet Aguilera, mediada pela crítica Lorenna Montenegro;
- e no Rio de Janeiro, na Cinemateca do MAM, também na sexta, 18/08, às 20h, terá um debate com a presença da diretora Paz Encina e da montadora Jordana Berg. A sessão é gratuita.
Trailer aqui.